domingo, 25 de setembro de 2016

Visita ao asilo

Nossa velha amiga foi pro asilo,
“Para ser melhor cuidada”
Tudo mais ou menos limpado,
A refeição sem cardápio (escolha)
É feita da xepa da feira...
Tudo bem que assim seja,
Pela falta de recursos patrocinados,
As camas divididas em quartos duplos,
Os bancos do jardim ao sol da tarde,
Mas o carinho passa longe
Na frieza dos olhares.
Há uma desistência nos andares,
Muitas feridas, algumas expostas,
Tantas cicatrizadas escondidas,
Convalescendo uma dor antiga,
Vindas de lares desmantelados
Onde meninos dormiam e comiam
Sob a benção já esquecida...
Agora procuro entender porque 
não morrem nesse tédio, porque
Já foram assassinados!


Cancros


Escutando esses olhares frios,
Fixos na inexpressão do nada,
Sorvem o sal à última lágrima
Sobre a terra que se arrasou...

Donde o fruto já não diz nada,
Quando o último chega, assenta,
Parece muito normal presença,
Tecem alguns laços de amarras

Mas silenciam de vez a manhã
Seus utensílios festivos ontem
E gritam a espantar o mal feito.

Apenas o silêncio é a descrença
De que haja algo ainda vivo
Na face lívida de olhar difuso...






Vasculhes


Passeando pela memória
Retentivas empoeiradas...
Algumas conchas vazias
Idas do mar das viagens...

Algumas flâmulas coloridas...
Umas miniaturas de garrafas,
Ainda até hoje desavindas,
Um silêncio sobre as formas,

Sobre as idas sem vindas...
Tanto quanto desabitadas
Nesta impensada berlinda.

Pois é, amancebado gregário,
As vidas passam esquecidas
Nesses fundos de armários...






Lenires


Descubro que as coisas
Acontecem por deixar
Que aconteçam...
Muito do que procuram
No dia a dia na sesta,
Nessa primeira hora
As emoções tomam conta
Por conta de umas pernocas
Bonitas e um sorriso meigo.
Depois por conta de susto
Por ter-me desprevenido...
Agora, armado e tentado,
Contra novos dissabores,
Descubro que quase nada
Pode contra meu intento
De lenir branda demora
Quando tenso.






Adversos


A parede se ilumina
Às tantas da madruga...
Sou criador ou criatura
Dessa palavra Poesia?
Que me cria... Me recria
Em cada gesto deixado ficar
Nas outras horas do dia...
Nesta hora silenciosa
O teclado se mostra trépido
Entre vogais avançadas
Sobre consoantes mortas.
Estamos aqui, eu e a palavra
Que crio a cada gesto,
A cada pensamento novo
Nessa velhice de tetos...
A parede se ilumina
No escuro da madruga
Entre silêncios e falas
Além desse criador sereno

Que me faz criatura.

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