sexta-feira, 7 de abril de 2017

Hora do banho


Hora de secar o banho,
Tomar uma decência e sair pela aí…
Voltar d’onde fiz-me pedra,
Em sendo gente,
Tendo dela feito o cutelo
Para com ele cortar
A pedra que me atravanca
Os passos destreinados
De ser-me gente…
Agora pássaro,
A voar esse novo passo
Sobre carcaças
Que me vestem
Por tempo enigmático,
Desse sonho borboletear-me
Ou ser para sempre lagarto?
Sei lá, o que fui e o que fomos?
O que seremos eu nesse pedaço
De futuro que nos resta,
Inda puros, inda turros,
Indigentes
Dessa pressa?

Lista de mercado


Quanta poesia
Pode haver na necessidade?
Arroz – agulhinha.
Feijão – carioca.
Óleo – de milho.
Sal – iodado.
Farinha – trigo.
Cacau – Toddy.
Leite – ensacado…
E eu, cansado de ser consumido,
Já não me encontro no mercado…
D’onde sei-me abduzido
Para tornar-me vegano,
Embora criado carnívoro…
Ora, ora, dona memória,
Até quando seremos devidos?
Mortos neste cansaço
Ou cansados por ter morrido?
Quanta poesia
Pode haver na necessidade…
Desde o andar de baixo
A este de já ter subido!

Tantas palavras


De quantas palavras
Desusei-me
Para chegar
Ao compreensível
Viver disso?
Por vezes atabalhoado,
Por vezes atabalado
Em vezes decisivos
Falares inconclusivos,
Embora conclusos!
Pensa que está acabado?
É só o início.











Rascunhado


Penso que somos rascunhos
Dado as tantas imperfeições.
A corrigir narizes disformes
A disformes interações fônicas…

Bocas babentas, enormidade
De detalhes a refazer-se nesse
Andar avesso de olhos vesgos
Sem consentimentos arguidos…

Um dia seremos seres refeitos
E nos tornaríamos perfeitos?
D’onde a vida terá outro jeito…

Nesse nos tornarmos flores,
Arquétipo mais que perfeito
À perfeição do último feito.

CONVIDO-OS A VISITAR





Nomes aos bois


Todas as demoras
Têm seus motivos.
Todas as esperas
Têm seus motivos.
Olho as coisas
E me pergunto
Como se sabiam
Antes inominadas?
Mas as coisas
Nem se importam
De terem sido
Nominadas…
Até mesmo
A palavra coisa
Perde o sentido
Vista assim,
Sem motivo…






Amojos


Quando vejo
O menino da roça
Ordenhando vaca
Amojada,
Sabendo o galo
Galado,
A égua enxertada,
Me dá uma pena
Desse menino
Citadino
Que dessas aulas
Não sabe nada…











A sobra da matéria


O lixo
É a sobra da matéria,
Seja ela árvore,
Gente ou pedra…
Mistura os restos
De cada criatura,
Seja lembrança
Ou amnésia,
Se desfaz em lixo
O que não se preza.
O lixo desfaz-se
De cartas de amor,
Decompondo erros.
Sim, é quando se erra
Que se torna detrito
Na vala comum da ida
Se desfazendo junto
No esquecimento
Lícito.







Invejo como se dão bem
Esses bichos de mato
Com o próprio mato…







Não é preciso dividir as coisas,
As coisas se dividem sozinhas
Em coisas vivas e coisas mortas,
É botar reparo para percebe-lo.












Do caboclo que fui
Ao caboclo que sou
Formulo ideias novas,
As que não renovo.








As aparências não enganam,
O que se pinta besta quadrada
Pode saber que será visto
Como besta no observando…







Meus deslizes


Vi, nos meus deslizes,
Que alguns poetas
Se mataram
Quando pensaram não ter
Mais o que dizer… Errado:
O que não dizes de ti
Dirão de ti os outros,
Que não te conhecem
Tão bem quanto
Tu mesmo pode
Te desconhecer…












O rio fazendo-se ao mar


O fato de os rios
Se fazerem ao mar
Influem em todo pensar…
Nas verdades mentidas
E nas mentiras que se tornam
Verdade com o amadurar.
Pesa em cada ato o desato,
O rio fazendo-se ao mar,
Despindo-se em corredeiras,
Das tilápias deixadas para trás,
Do aprendizado do antes
Nas correntezas de viver-se
O rio fazendo-se ao mar,
O menino fazendo-se homem
E aprendendo se deixar para trás
Nas mentiras de sua verdade
Forçado aceitar em tantas idas…
O rio fazendo-se ao mar,
O rio fazendo-se ao mar,
O rio fazendo-se ao mar,
Até que se salgue a vida.


No uso da palavra


No uso da palavra
Não a penso como sobra
De sentimento,
Nem há penso a puxa-la
Como fornecedora
De pensamento.
Assim, nos damos bem,
Quando ela não quer vir,
Entendo… Volto amanhã
Com nova proposta,
Quem sabe
Na manhã de amanhã
Eu possa,
Com o uso da palavra,
Chegar ao senso.












Enquanto as ideias enferrujam
É preciso correr com elas
A terminar cada pensamento,
Depois não prestam para nada…








Todos os sermões
Serão ouvidos…
Alguns serão escutados.











Nos vazios das páginas,
Além das palavras
Fica a poesia entrevada…









Se você perdeu pensamentos
Sabe que a todo momento
Tem de podar galhos secos
À espera de galhos novos…










Tudo que se escreve,
No papel ou na areia,
Vai sumir com o tempo
Da próxima maré cheia…







Das coisa de que lhe digo
Se não se entender comigo
Nem sem migo há de aceitar-me.








Quando meu pai era velho


Quando meu pai era velho,
Ficava ouvindo seu assobio
Intermitente,
Como fora um lobo
Marcando seu território…
Quando meu pai era velho
Eu inda nem sendo gente
Seguia seus passos trôpegos
Mancando suas dores,
Vivendo suas lembranças,
Vencendo suas batalhas
De quando não era velho.
Agora sou eu o velho!
A terminar cada frase
Com uma recordação
De quando meu pai era velho
Ainda nem o sendo.






Procederes


Os meninos passam,
Saindo em bandos da escola,
Chutando latas e gatos,
Fazendo pose de homens…
Querem-se donos,
Além de suas mochilas, da rua,
Onde se extasiam de ser…
Os meninos passam…
A meninice passa…
Fico pensando em quando
Essas pessoas poderão
Se adivinhar gente!



Arrogados


Não se mede
A conscientização
Com fita métrica,
Por isso o mal político
Não tem tamanho de ser.
Apenas concorrem
Com aprisionados a culpa
Pelas mortes antecipadas,
Cada um com seu armamento,
O da palavra mais mortal,
O do fuzil mais barulhento…
Bandido de terno, farda ou toga
Tem de ter mais culpa
Pois foi preparado
Quanto ao saber-se vil,
Arrogado.


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