Chiados
Se alguém morrer de amores
Enterrem-se o em louvores...
Falo por mim, sem saber
Se empunharás teu sabre
Aos procuradores de culpas
Às perguntas de apressados
Que de mim não se ocupem,
Apenas de seus passados...
Se alguém morrer de dores
Procuremos só consola-lo,
Que tempo cobrirá de flores.
O que a tempo bem sabes
É que os velhos e doutores
Ouvirão aqui seus chiados.
Desforços
Da vez que um menino chora
Ou sente dor ou é desamado,
A culpa será dividida agora
Entre receios e acamados...
Este menino, dolorosamente,
Sente-se abandonado entre
Formas vis em que foi criado
Pelo abandono desforçado
Se o vês assim desconsolado
Procura sua finda mocidade
O que em ternura foi negado
Que ocasião mostrará adiante
Este menino não teve alento,
Pulou a rica fase de infante
Colcha de floradas
No chão trincado
Pela seca do deserto
A floração miúda destaca-se
Em colcha desenhada...
Nova geração
Quando a análise lógica
Torna-se análise psicológica...
Mario
Quintana
Agora é tarde
Tivemos tempo
Para corrigir nossos erros...
Agora é tarde.
Tivestes tempo
Para retornar à casa...
Agora é tarde.
Estivemos confabulando
Ideias vazias espremendo-as
Contra novidades...
Agora é tarde?
Como seria o agora
Se tivéssemos arguido
Dos propósitos disso,
Antes que tarde?
MARGEANDO
A página em branco,
Virgem, imaculada,
É o retrato da ingenuidade.
Por isso abusam dela
Impondo obscenidades
Em suas margens...
Mementos
Nossas vidas prosperam
Até uma certa meia idade...
Depois arrasta-se
Presa às familiaridades,
E, penosamente contrai-se
Entre achegos e enfermidades,
Até desacorrentarem-se
E esvoaçarem
Pelas saudades...
Todo fim teve um começo,
Assim se determina que
Cada um tem o seu preço...
Mania de querer servir-se
Servindo o outro...
Este fetiche não funciona
Se fores o outro...
E eis que, tendo Deus
Descansado no sétimo dia,
Os Poetas continuaram
A obra de Sua criação...
Mario Quintana
Solidão é quando
Estar só
Se torna incômodo...
Da intuição dos meios
Vendo esses pequenos
Gatunos pelas ruas
Fico pensando se eles sabem
Como seria um lar...
Com o fogo aceso no inverno,
Com o chá servido com pão quente,
Com uma cama, mesmo de capim,
E um tempo de brincar carrinhos...
Vendo esses pequenos
Abandonados pelas ruas
Fico pensando em salva-los
Dessas amas cruéis, selvagens,
Com seus carros velozes
E suas madames desdenhando
A fome alheia...
Como se fosse fácil ser madame
Sem ter um berço
Onde deitar a cabeça
Amaciada pelo desvelamento...
Como seria esta madame
Que se faz de pura
Se não houvesse esse zelo
Pela sua soltura...
Se tivesse meios, mas os há...
Coragem até temos
Mas não temos desprendimento
Para soltar os arreios
Da comodidade
E seguir a intuição
Dos meios
Barbatanas
Sou do tempo em que
Se prendia colarinhos engomados
Das camisas com barbatanas...
Termo que se perdeu nos costumes,
Até nos dicionários...
Hoje, como as barbatanas, perdemos
Pelo futuro nossos passados...
Sinto pena desses jovens
Que viajam sonhos, formados
Em suas aptidões sonhadas,
Desertam para Europas e Japões
Acerbados em trabalhos braçais,
Se não regredimos, não avançamos,
Nossos ascendentes vinham de lá
A serem subjugados nesta terra
Brasilizada para os mesmos fins...
Substituir escravos, hoje patronados,
Europeus e americanos do Norte...
Esses que partem, apartam almas,
As que ficam e as que se espaçam,
Que lástima.
sergiodonadio
Nenhum comentário:
Postar um comentário