Entalhes
Nosso tempo,
Cinzelado com tantos detalhes,
Entalha cores e dores
E prazeres
Num mesmo cinzel ornado
De labores distraídos
Na falsa moldura
Dessa escultura ao prazer velado
Na dor do dissabor
Das horas mal dormidas,
Caladas nas noites chuvosas
De memórias distraídas...
Tempos há
Tempos há
Em que perseveramos
Nas coisas fúteis
De nossos enganos...
Tempos há
Em que revigoramos
Saudades moventes
De nossos labores
Mas,
Sob a égide de pensamentos,
Ordenhamos o lume
De úberes cheios
De amores etéreos
D’outros valores...
Falam da volta
de Jesus, sem reconhecer que Ele volta em cada
criança que nasce...
Conheces o caminho
de volta?
Aos longes tracei
estrada
Pisando passadas
largas,
Pelo
fio dessa navalhada
Cortei guaxuma de
malha,
Cruzei riacho em pinguela
Cercando os passos
dela...
Contei sextas
amarelas
Na procissão das gamelas,
Assim cruzamos as
fitas
Amarradas em
palafitas,
Por destino dessas
lidas
Deitadas estrada
afora
Tentando vencer revolta,
Sabes o caminho de volta?
Chuvarada
O gado está
atolado
Numa sequência de
águas...
Eu tinha fé neste
roçado
Antes promessas de
nadas,
Mas tudo
desmoronou
Na consequência
das águas,
E tudo se imergiu
De ideias
erradas...
O gado está
atolado
Num mar de culpas
iradas
E vejo cabeças
perdidas
Em lágrimas...
De quando em
quando
Passa um
naufragado,
Navegando suas
mágoas,
Depois de mortos
Os homens ficam
mais fortes
Ante a chuvarada...
sergiodonadio
O dia em que o
morto acordou
O dia em que o
morto acordou
Acordou-se para o
mundo,
De ter sido um capinzal
Num milharal
profundo
Cheio de vias
aradas
Entre
latifúndios...
O dia em que o
morto acordou
Deu-se conta de
passados
Insalubres,
anegados,
Deixados fenecer
de dados
Afundidos em
traçados...
Pensa que lembra
agora
De não ter sido
lembrado.
O dia em que o
morto acordou
Já era noite seu
dia
Sem a mesma
euforia
De quando morrera
estafo...
O que faz falta...
Talvez o chão de
barro
Para pisotear
fofando...
Talvez a poeira
dos dias secos,
O pó-de-serra da
serraria,
Ou a ponte de
descarregar café
Íngreme do chão ao
céu...
Sei não, não fora
a paz vivida
Neste canto
esquecido
Talvez fugisse à
lembrança
Detalhes dessa
infância,
Não revivida...
A maior estrada do
mundo
Liga minha cidade
À cidade nenhuma,
Que é caminho de
minha mente
Entre o pensar e o
esquecido
Momento de passear
Ruas
desconhecidas...
A maior estrada do
mundo
Me passa ali
adiante
O ser e o ter sido
Criança na voz
adulta
Do hoje viajado
nela
Sem pegada, sem
arrego,
Apenas o
desassossego
De ela ter um fim
Em mim mesmo...
Como em nós,
Vive na velha casa
A presença invisível
De alguma alma...
Pensar que a
dúvida
É feita de
respostas...
Prazeres e
desprazeres
O tempo está a
esgotar-se:
Passou o tempo da
meninice,
Passou da
adolescência,
Passou da imaturidade,
Chegou a
impaciência...
Mas a dor de viver
não passa,
Vem com o prazer
Ou a macaca...
A função da poesia
É o regozijo da
razão...
A idade cria rugas
Na face e na
mente,
Não se alma
Estiver
presente...
Das vivacidades
Que a idade nos
presenteia,
Uma, de muita
necessidade,
É
descomprometer-se com nadas.
Outra, mal
percebida,
É que a dor nos dá
guarida
Ante as dores de
partida
Nas alegrias
variadas
De tantas flores
floridas
No passar das
madrugadas
Pensando que fazer
da lida...
Emendas
Assim a gente
perpetua
Sentimentos para além
Das verdades
assumidas
Em chegadas e partidas...
Anseio reviver
momentos
Deixados nas despedidas...
A gente acentua cicatrizes
De embates
ribombados,
Além das peças
rasgadas
Retalhadas de
passados
A gente ainda à procura
Entre partidas e
chegadas
Retalhos perdidos
n’agua
Deixados nas enxurradas ...
Conterrâneos
Nascido na pequena
cidade,
Que me parecia tão
maior
Que meu sonho de
tamanhos...
O armazém e suas
doçuras,
A escola com suas
unhas,
A rua com suas
pedras,
O pai com sua
lisura...
Nesta pequena
cidade
Cresci vendo
esculturas
Vivas nas
fricoteiras,
Antiga nas
formosuras...
Não é de quando a
gente sabe
Que o mundo é
feito em miúdes
Que o tempo em si
se reparte
Do berço ao
ataúde...
‘
Você pode
sentir-se só
Numa multidão
E bem acompanhando
Por estar só
para que não se
esqueça
folhear os dias
passados
relendo passos
dados
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