sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

 

Cenas passantes

 

Descrevo,

No que escrevo,

Cenas cotidianas...

Cada palavra acena

A um passado, nebuloso?

São favas contadas,

Mas vivas,

No atual momento

De vidas...

Não lembro bem

A voz de meu pai,

Mas vendo este senhor,

Que a mim se parece com ele,

Esses passos trôpegos,

Que ele apresentava,

 

 

Essa calva acentuada...

Lembro gestos,

Mas não consigo lembrar

Expressões de meu velho pai,

Agora que o velho sou eu!

Com a memória pouca,

O mesmo cansaço dele,

O semblante atenuado...

Agora, o passante passa,

Não devo interpela-lo,

Mas lembra de um modo

Aquele antigo meu mundo,

Em cada passo...

 

 

Sem medo de colher o meu plantio

 

Semeei minhas estórias

Para a história de meu tempo...

Assumi minhas derrotas

Entre meus contentamentos...

Argui minhas dúvidas

Ao meu assentimento...

Passeei por vias tortas

Procurando meus instintos

De como reviver memórias

Neste labirinto...

Concluo que o tempo audita

O desperdício da forma,

Onde a norma é bendita

E me conforma...

 

Viajando a paisagem

 

À minha frente o mundo

É pequeno...dele só vejo pedaços,

Tentando adivinhar o invisível

Fora de meu raio de visão...

Depois da esquina outra esquina,

Depois do morro outro mundo...

Cada paisagem o pensar profundo,

Talvez haja novidade além de muros,

    Tenho meus medos a novos estudos...

Talvez um rio, uma ponte, silêncio?

Pode seja apenas o som de um fio

Em provimento...

 

 

 

Quanto a mim

 

Quanto a mim

Bem sei que venci paradas

E estou aqui...

Quanto a mim

Perambulando pelas tardes

Não me perdi...

Quanto a mim

Lendo abolicionistas

Encontro valores perdidos

Nas desaguas...

Mas o tempo limpa

As enxurradas deixadas

Pelas chuvaradas

E torna o chão outra vez

Liso e afeito às causas...

No meu silêncio

 

No meu silêncio grito alto

As vontades resistidas...

Talvez a parte mais lúcida

De nossas vidas...

Neste silêncio e seu alarde

Me vejo grande dentro da tarde

Em que voamos

Sem asas púrpuras,

Apenas asas...

Em tal silêncio a grita esparsa

O susto dos passarinhos

De das lagartas...

No meu silêncio a vida aparte,

Como arte...

 

Efêmeros

 

O homem cria,

Mas não é o deus

De sua criatura...

Às vezes nem tem

Tal estatura,

Que possa arcar

Com sua figura...

O homem cria,

Na cria se recria

Entre fracassos

De aventuras

E a forma lânguida

Com que esturra

A face verdade

De sua altura...

Os maus elementos

 

Terra, água, fogo, ar...

Às vezes esses elementos

Se rebelam,

Inundam vales de profundo esgar...

Montanhas cospem fogo,

Marés invadem além-mar,

E o ar, neste refogo

Faz a terra nos aterrar...

Talvez sejam sobras do logro

Que maus elementos

Põem a somar...

Terra, fogo, água, ar

Se combinam em esmarridos

Soluçar...

sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

 Clarões da vida

Onde a tarde se faz nítida,
Jornada de vários caminhos,
Estrada de várias idas...
Quando o fogaréu vira cinzas,
As pessoas divergem
De si mesmas, em outras tardes,
A mobília é a mesma, os tapetes,
Janelas abrindo floradas e varais...
Mas o tempo leva as cores velhas,
As primaveras deixadas ficar
Entre retratos e verdades...
A sensação doída
De que nada volta atrás...
sergiodonadio

quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

 

Previsões imprevisíveis

Prever o fim do mundo,

Um pensamento profundo...

Já previsto tantas vezes

Desde cristo, desde sempre...

Desde que se viu eclipses,

Assustadores escurecimentos,

Seria este o momento?

Estrelas caindo no firmamento,

Meteoros, nebulosas,

Granizos tensos...

A cada fim um novo mundo

Com ossadas defuntas,

Ilhas vulcânicas, veredas fundas,

Seria então hoje, neste mar defunto,

O tempo último?

 

O espelho que te vê

 

O espelho que te vê

Por trás de teu rosto,

Te enxerga longe

Onde enxergas pouco...

Vê tuas lamúrias

E teus desgostos,

A gastura das lentes

E dentes frouxos,

As mãos trêmulas,

0s passos trôpegos...

O espelho que te vê

Onde não te enxergas

Sobre rugas e cerdas,

Onde passas o dia

Sem alegria,

As noites sem poesia...

 

 

O espelho que te vê

Nos olhares toscos,

Com que vislumbras

O amanhã a seu gosto,

A sopa rala, dores caras

Ao sol posto...

O espelho que te vê

Não se confunde,

Tua cara muda

A cada agosto...

 

 

 

 

 

 

No correr das noites  (publicado)

 

No correr das noites

Se fabricam os dias,

No escuro fica fácil

Confundir os cheiros,

Erros, sustos, brejos podridos

Sem a medição

Dos sentidos perdidos

Entre silêncios e gritos

No correr da noite

Os pardos são bem quistos,

Desde a onça parda

Ao pardo gato perdido,

Aqui se encontram inimigos

E se entreolham no brilho

Do escuro dos olhos

Espertos nisso...

 

A história que os pássaros contam

 

Na história

Que os pássaros contam

Revivem guerreiros de ontens

Na frustração

Dos viventes de hoje...

Descendentes desses bravos

Se alvoram em civilizados

Para fugir à pedrada

Dos covardes...

Na história

Cantada pelos pássaros

Não há lugar às desistências,

Apenas sobrevivem

                      Vidas intensas...

 

 

Perspectivas

 

Escrever é uma necessidade,

Como se alimentar,

Como se viajar, mesmo sem ir,

Como se admirar, em sendo fácil

Ou difícil de se aceitar,

Mesmo que seja feio se admirar

Entre as fases de espera e saldo...

Viver é uma necessidade social,

Mesmo que intragável

Do ponto de vista final.

 

 

 

 

 

 

 

 

Quem está certo?

-O errado?

 

 

 

 

 

 

Os olhos veem o mar,

Mas os olhos sentem o mar?