Sem medo de colher o meu plantio
Semeei minhas estórias
Para a história de meu tempo...
Assumi minhas derrotas
Entre meus contentamentos...
Argui minhas dúvidas
Ao meu assentimento...
Passeei por vias tortas
Procurando meus instintos
De como reviver memórias
Neste labirinto...
Concluo que o tempo audita
O desperdício da forma,
Onde a norma é bendita
E me conforma...
Viajando a paisagem
À minha frente o mundo
É pequeno...dele só vejo pedaços,
Tentando adivinhar o invisível
Fora de meu raio de visão...
Depois da esquina outra esquina,
Depois do morro outro mundo...
Cada paisagem o pensar profundo,
Talvez haja novidade além de muros,
Tenho meus medos a novos estudos...
Talvez um rio, uma ponte, silêncio?
Pode seja apenas o som de um fio
Em provimento...
Quanto a mim
Quanto a mim
Bem sei que venci paradas
E estou aqui...
Quanto a mim
Perambulando pelas tardes
Não me perdi...
Quanto a mim
Lendo abolicionistas
Encontro valores perdidos
Nas desaguas...
Mas o tempo limpa
As enxurradas deixadas
Pelas chuvaradas
E torna o chão outra vez
Liso e afeito às causas...
No meu silêncio
No meu silêncio grito alto
As vontades resistidas...
Talvez a parte mais lúcida
De nossas vidas...
Neste silêncio e seu alarde
Me vejo grande dentro da tarde
Em que voamos
Sem asas púrpuras,
Apenas asas...
Em tal silêncio a grita esparsa
O susto dos passarinhos
De das lagartas...
No meu silêncio a vida aparte,
Como arte...
Efêmeros
O homem cria,
Mas não é o deus
De sua criatura...
Às vezes nem tem
Tal estatura,
Que possa arcar
Com sua figura...
O homem cria,
Na cria se recria
Entre fracassos
De aventuras
E a forma lânguida
Com que esturra
A face verdade
De sua altura...
Os maus elementos
Terra, água, fogo, ar...
Às vezes esses elementos
Se rebelam,
Inundam vales de profundo esgar...
Montanhas cospem fogo,
Marés invadem além-mar,
E o ar, neste refogo
Faz a terra nos aterrar...
Talvez sejam sobras do logro
Que maus elementos
Põem a somar...
Terra, fogo, água, ar
Se combinam em esmarridos
Soluçar...
Agulhas
Fiando minhas verdades
Neste tecido arrazoado,
Prego botões zipando atos,
Costuro barras aviadas...
Quero a perfeita costura
De meus atos agulhados...
Em plena tarde de sóis
Percorro a luz da janela
Arrematando os lençóis
À espera dela...
Corte e costura
A moda
Não é lançada por costureiros,
Senão pela necessidade
De angariar madames,
Quando um senhor
Com suas agulhas
Se esforça para satisfaze-las...
Talvez seu conceito
Seja diverso destes,
Mas tem de vesti-las princesas
Em cada seu momento,
Assim se conversam e se convertem
Em apadrinhados de momentos,
E fazem renda e rendilhados
À força de entendimentos...
Num tempo em que espelho
Não era tão sincero
O relógio já marcava horas,
Mas não doía tanto...
Trem noturno,
Qual estação se abre
À solidão da madrugada?
Um cisco na folha do livro,
Um inseto morto
Ou marcador de página?
A manhã de hoje se enternece
Lembrando outras, de quando
Manhãs apagavam lampiões...
A palavra sincera dói,
Mas cicatriza...
Onde eu estava quando
A vida começou em mim?
Que mal faz que não seja
Nestes dias insinceros
Vivemos o faz de conta,
Que o tempo que perdemos
Nos seja realidade,
Aqui não conta...
Que mal faz que não seja
Branco o amarelecido?
É sujeira de um tempo vivido,
Desguardado ao relento...
Que já não preste...
Que mal faz que não seja
Límpido o chão chuvado,
Se ainda não enxurrou
O desaguado?
Que bom seria, a tempo,
O vidro não se medrasse,
E mesmo o tendo esquecido,
Inda brilhasse...
Que mal faz que não seja
Se o tempo amareleceu
Nossas vontades?
Inda sonhamos, nos sonhos,
Nossas verdades...
SERGIODONADIO
O menino sábio
Eu, adulto,
Queria que se matassem
Todas as barbaridades,
Os que as cometessem,
Os que as aceitassem...
Malgrado as seitas,
O eu menino em mim,
Que persiste, inda que tarde,
Me diz:
-Espera, que a raiva passe...
Perdoa, que tem perdoam tanto,
Pelo muito que aprontastes...
Pelo que vieste, pela descoragem,
O eu menino tem preces
Que o eu adulto nem sabe...
Importa a mim as verdades
Que as mentiras trazem...
Tens de falar o que pense,
Antes que se dispense...
Tudo é válido nas teorias,
Mesmo que a ordem
Dos fatores negue...
Pensei que meus óculos
Estavam sujos, tirei-os,
A visão continuou
Turbada...