terça-feira, 22 de novembro de 2022

 

Conterrâneos

 

Nascido na pequena cidade,

Que me parecia tão maior

Que meu sonho de tamanhos...

O armazém e suas doçuras,

A escola com suas unhas,

A rua com suas pedras,

O pai com sua lisura...

Nesta pequena cidade

Cresci vendo esculturas

Vivas nas fricoteiras,

Antiga nas formosuras...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Se tudo desacontecer

Pausemos o tempo,

Reflitamos o porquê,

Direcionemos o amanhã!

 

 

 

 

 

 

 

 

Não é de quando a gente sabe

Que o mundo é feito em miúdes

Que o tempo em si se reparte

Do berço ao ataúde...

 

 

 

 

 

 

Você pode sentir-se só

Numa multidão

E bem acompanhando

Por estar só

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Diálogos possíveis

 

Converso bastante

Comigo mesmo...

Me conto coisas

Que se tornam fatos,

Apago fatos

Que me são boatos...

À força desses hiatos

Me descomprometo

Com meros relatos...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Quem te fará doce

No amargo de teu viver?

A paz esteja convosco

A cada teu amanhecer...

 

 

 

 

 

 

 

É mais fácil

Combater o fogo

Se não estiveres

Dentro da fornalha...

 

 

 

Para que não se esqueça

Folhear os dias passados

Relendo passos dados

 

 

 

 

 

Por esta gente que vai,

Por esta gente que fica

Olhando a despedir-se

Larica

 

 

 

De tanto pensar

Que o tempo não passa

Olha ele aí, a passar...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Combinações

 

A gente combina

Horários à razão

Depois sonega a restituição...

A gente empenha

A palavra momentânea

Depois se nega à confirmação...

A gente pena

Mas não se entrega

À paz que tem via de regra...

E volta e meia

A gente esperneia

Negando a combinação...

 

Encantos da vida

 

O encanto da vida

É perceber uma saída...

Hoje sepultamos mais um corpo,

Não vou deitar lágrimas por isso,

Vou orar pela alma que parte

Deste corpo cansado...

Olhar para o sol que se despede

Sem lamuriar esta partida...

Vou seguir com o mesmo olhar

A flor que se abre à brisa...

Vou passear o pensar

Em outras vindas...

A cada campa fechada

Um novo leito vibra...

O encanto de vida é chegar

A cada partida...

 

sergiodonadio

terça-feira, 8 de novembro de 2022

 

Entalhes

 

Nosso tempo,

Cinzelado com tantos detalhes,

Entalha cores e dores

E prazeres

Num mesmo cinzel ornado

De labores distraídos

Na falsa moldura

Dessa escultura ao prazer velado

Na dor do dissabor

Das horas mal dormidas,

Caladas nas noites chuvosas

De memórias distraídas...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Tempos há

 

Tempos há

Em que perseveramos

Nas coisas fúteis

De nossos enganos...

Tempos há

Em que revigoramos

Saudades moventes

De nossos labores

Mas,

Sob a égide de pensamentos,

Ordenhamos o lume

De úberes cheios

De amores etéreos

D’outros valores... 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Falam da volta

de Jesus, sem reconhecer que Ele volta em cada criança que nasce...

 

 

 

 

 

 

Conheces o caminho de volta?

 

Aos longes tracei estrada

Pisando passadas largas,

              Pelo fio dessa navalhada

Cortei guaxuma de malha,

 

Cruzei riacho em pinguela

Cercando os passos dela...

Contei sextas amarelas

Na procissão das gamelas,

 

Assim cruzamos as fitas

Amarradas em palafitas,

Por destino dessas lidas

 

Deitadas estrada afora

 Tentando vencer revolta,

  Sabes o caminho de volta?

 

 

 

 

Chuvarada

 

O gado está atolado

Numa sequência de águas...

Eu tinha fé neste roçado

Antes promessas de nadas,

Mas tudo desmoronou

Na consequência das águas,

E tudo se imergiu

De ideias erradas...

O gado está atolado

Num mar de culpas iradas

E vejo cabeças perdidas

Em lágrimas...

De quando em quando

Passa um naufragado,

Navegando suas mágoas,

Depois de mortos

Os homens ficam mais fortes

Ante a chuvarada...

 

sergiodonadio

 

O dia em que o morto acordou

 

O dia em que o morto acordou

Acordou-se para o mundo,

De ter sido um capinzal

Num milharal profundo

Cheio de vias aradas

Entre latifúndios...

O dia em que o morto acordou

Deu-se conta de passados

Insalubres, anegados,

Deixados fenecer de dados

Afundidos em traçados...

Pensa que lembra agora

De não ter sido lembrado.

O dia em que o morto acordou

Já era noite seu dia

Sem a mesma euforia

De quando morrera estafo...

 

 

 

 

O que faz falta...

 

Talvez o chão de barro

Para pisotear fofando...

Talvez a poeira dos dias secos,

O pó-de-serra da serraria,

Ou a ponte de descarregar café

Íngreme do chão ao céu...

Sei não, não fora a paz vivida

Neste canto esquecido

Talvez fugisse à lembrança

Detalhes dessa infância,

Não revivida...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A maior estrada do mundo

 

Liga minha cidade

À cidade nenhuma,

Que é caminho de minha mente

Entre o pensar e o esquecido

Momento de passear

Ruas desconhecidas...

A maior estrada do mundo

Me passa ali adiante

O ser e o ter sido

Criança na voz adulta

Do hoje viajado nela

Sem pegada, sem arrego,

Apenas o desassossego

De ela ter um fim

Em mim mesmo...

 

 

 

 

 

 

 

 

Como em nós,

Vive na velha casa

A presença invisível

De alguma alma...

 

 

 

 

 

 

 

Pensar que a dúvida

É feita de respostas...

 

 

 

 

 

 

 

 

Prazeres e desprazeres

 

O tempo está a esgotar-se:

Passou o tempo da meninice,

Passou da adolescência,

Passou da imaturidade,

Chegou a impaciência...

Mas a dor de viver não passa,

Vem com o prazer

Ou a macaca...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A função da poesia

É o regozijo da razão...

 

 

 

 

 

 

 

A idade cria rugas

Na face e na mente,

Não se alma

Estiver presente...

 

 

 

 

 

 

 

 

Das vivacidades

 

Que a idade nos presenteia,

Uma, de muita necessidade,

É descomprometer-se com nadas.

Outra, mal percebida,

É que a dor nos dá guarida

Ante as dores de partida

Nas alegrias variadas

De tantas flores floridas

No passar das madrugadas

Pensando que fazer da lida...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Emendas

 

Assim a gente perpetua

Sentimentos para além

Das verdades assumidas

   Em chegadas e partidas...

 

Anseio reviver momentos

   Deixados nas despedidas...

 A gente acentua cicatrizes

De embates ribombados,

 

Além das peças rasgadas

Retalhadas de passados

A gente ainda à procura

 

Entre partidas e chegadas

Retalhos perdidos n’agua

     Deixados nas enxurradas ...

 

 

 

 

Conterrâneos

 

Nascido na pequena cidade,

Que me parecia tão maior

Que meu sonho de tamanhos...

O armazém e suas doçuras,

A escola com suas unhas,

A rua com suas pedras,

O pai com sua lisura...

Nesta pequena cidade

Cresci vendo esculturas

Vivas nas fricoteiras,

Antiga nas formosuras...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Não é de quando a gente sabe

Que o mundo é feito em miúdes

Que o tempo em si se reparte

Do berço ao ataúde...

 

 

 

 

Você pode sentir-se só

Numa multidão

E bem acompanhando

Por estar só

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

para que não se esqueça

folhear os dias passados

relendo passos dados