sábado, 8 de janeiro de 2022

 

Gastos

 

Dentro do poema,

(Se houver poesia)

Encrudesce a verdade

Contida nos silêncios

Emoldurados de lavras...

Na conta da verdade

A encrudescer o verso

Há de haver a casca

Protetora de sentidos...

Na conta dos sentidos

Caberá enfim a poesia

Deixada fluir no poema

Gasto em evidências...

 

 

 

 

 

 

 

 

Temporal

 

Se vira o sol em chuva

De repente o assunto muda...

 

 

 

 

 

 

 

 

De conversa em conversa

De repente vozes se calam

Onde verdades estalam...

 

 

 

 

 

 

 

 

Meus guardados

 

Meus guardados

São guardanapos nas gavetas,

Rabiscados entre sonos,

Sorrisos nos retratos

Resguardados de sofreres,

Lágrimas ocultadas

Nas vertentes de emoções...

Meus guardados valorosos

São ideias e saudades,

O resto vai pro lixo

Dos esquecimentos...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

De herança

 

Pai e mãe tiveram

Uma vida simples,

A casa cheia de filhos,

Vindos de um a um

Transmitindo amores...

A fome de minha avó,

Trazida de anos de penúria,

Quando morava conosco

E tinha fartura, escondia lanches

Pelo medo do amanhã

Revestido de ontens...

O pai com mãos calosas,

A mãe com brasas em prosas

De verdades sinceras...

Herdamos deles a vida,

Que mais esperar no encanto

De serem vividas?

 

 

 

 

Desalentos

 

Como

As pessoas

Se vão da gente

Sem perguntas

Ou respostas,

Apenas acenos

Imaginários

De adeuses...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Expectante

 

Quero apenas expectar

Os arredores de meus setentanos...

Desanuviam-se as dúvidas,

Quando me achei demais,

Passou, agora me sei de mais.

Não estou a fazer projetos

Do arquiteto que nunca fui

Sobra o construído

Em tijolos que empreendi.

Hora do silêncio,

Bom para poetizar,

Daqui a pouco a manhã

Nos trará a luz, do sol,

No lugar da luz das ideias,

Depois acordaremos

O senso outra vez...

 

 

 

 

 

Na sala de velórios

 

Não há mortos visíveis,

Todos cabisbaixos escondem

Terem morrido...

Salva-se a um canto um menino

Brincando de herói.

Todos os ignoram

Na sua inocência sem culpas,

Ou dívidas bancárias,

Ao longo do silêncio

Os mortos ali presentes

Confraternizam com sua ideia

De vidas...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Roupas abodegadas

 

Dia de lavar roupas,

Lavam-se lençóis, fronhas,

Em separado toalhas

E camisas brancas,

Calças e mentes...

Dia de lavar roupas de baixo,

Íntimas derrotas

Enxaguadas e torcidas

Como a memória dos dias idos...

Dia de lavar roupas de festa,

De missa, de provas vencidas,

Um consumismo de trapos...

Dia de lavar possibilidades,

Negócios e namoros desbotados,

Procissão de valores destímidos,

Decididos serem válidos,

Já desvalidos como velhos

Senhores de tempos idos...

 

sergiodonadio