sexta-feira, 29 de abril de 2016


Café expresso
Excertos do livro Desfraldes
Dedico aos gladiadores do Congresso
Somos espelhos,
Quando olho seus gestos
Copiando os meus, vejo que
Estou copiando os seus...
A calma aparente
Entre paredes acinzenta
As mesas com toalhas
Quadriculadas,
As xícaras no aparador
Esperam... Esperando o nada
Acontecer aqui e lá fora...
A parede forrada de garrafas
Sujas, envelhecidas,
Deixa ver através dela
Novos gestos espelhados.
Somos todos vencedores
E perdedores na perdição
Nessas guerras de silêncios.
Somos aparadores
De xícaras que se movem,
Que levantam cedo
E trabalham... Se atrapalham...
Pegando o ônibus
Das quatro horas da manhã
E voltando à meia noite.
No meio da noite
Tomamos café e nos olhamos,
Fitamos nossos ombros cansados,
Nossos sapatos molhados,
Nossa roupa rota...
Então somos iguais?
Aparentemente, mas divagamos
Entre candidatos de esquerda
E de direita... Nenhum
Apontando à frente.
Então somos desiguais...
Diferentemente iguais
Perante a crise de desemprego,
De desescola, de dessaúde...
Amiúde nos encontramos
Nessas fomes que permeiam
Nossos gestos partidários...
E vemos que somos espelhos
Da mesma falta de governo,
Da mesma falta de futuro,
Das mesmas faltas... De passado!
Ele está calmo, olhando
Meus sapatos. Eu estou calmo,
Olhando os seus sapatos...
Ele toma o café amargo,
Essa é a pequena diferença,
O meu é adocicado.
Então nos cedemos à verdade:
-Estamos fudidos!!
Sua camisa vermelha me assombra,
Minha verde amarela alma
Assombra sua calma...
Nós lemos o mesmo jornal,
Mas nossas leituras são diversas,
Eu vejo canalhas de ambos os lados,
Ele se acanalha tentando
Justificar arroubos doutrinários.
Pode seja verdade
A sua expressão muda
Frente à realidade bruta...
Pode seja verdade
Meu sonho para o amanhã...
E, como ele, passo a ler velórios,
A ler esportes, classificados,
Para não ceder à ilusão
De que tudo esteja perdido.
Um cão vadio derruba o lixo,
Está mais certo que nós dois,
Menos faminto, mais saciado
Em sua fome sem dor.
Não vejo o céu claro esta manhã,
Mas o que importa?
Se todas as manhãs o sol
Virá conferir nossa revolta,
Nossa aquiescência ao mal,
Nosso despreparo para o lixo
Que este cão vasculha?
Assisto a todos os sermões
E não compreendo as razões
Desses religiosos cegos
Pela desatenção aos cleros,
Apenas repetindo salmos
Que não entenderam...
E vejo que hoje é o amanhã,
Feito do ontem reciclado,
Melhorado ou piorado,
Que importa?
Importa que a fome,
Via desemprego,
Bateu em mais portas
E ameaça fechar a fé
Em arruaças pelo saque
Aos grandes depositários...
Que importa o amanhã
Se hoje Inez é morta?!
Procuro, em vão, uma resposta
À indignação que me revolta:
Por que?! Porque somos tantos,
Tontos pela espera da esperança,
De tantos tempos tatuados
Em formas de amanhãs...
O hoje ontem foi vencido
Pelo conformismo...
Agora estamos consolando
O fim dessa manhã
Com café frio e moscas
E cães vadios e gatos perdidos,
E mendigos que perderam
O trem da noite vencida
E se amontoam nas portas
Fechada
O que será dessa imensidão
De fracos nas calçadas?
Procuro, nesse espelhamento,
Entre os lixos e sobras secas,
O que me apraz: Vidro?
Papel? Recicláveis?
O que será de nós nessa lixeira?
Seremos o lixo deles amanhã,
Seremos recicláveis amanhã?
Seremos podridos restos amanhã?
Procuro nesses olhares perdidos
Uma resposta: Quem seremos
Depois desse café Expresso,
Na pressa de encontrar
Nossos reflexos?!
Pode seja apenas sonho,
Ou pesadelo,
Mas é real o que sinto e vejo
Sentirem nessas mesas
Ordenadas
Com suas toalhas quadriculadas
Dando a impressão de largas,
De maiores, de ancho rescaldo
Das noites passadas
Nessa manhã de solitudes
E nada... Nada poderá
Vencer nossa derrota
Frente à necessidade de respirar
Esse ar mofo das verdades...
Nada nos fará desistir,
Mas poderá nos fazer
Regredir ao nada!
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quarta-feira, 27 de abril de 2016

Lugares comuns
Se há um lugar comum
Entre os indecisos
É a espera pelo outro...
Se há um palpite sobre,
É à espera do outro...
Assim o outro é a lei,
A memória, a esperança?
E se o outro não vier?
Se o outro se for antes?
Se o outro não existir?
Se há um lugar
Onde apoiar-se, é você!
No instante em que
A porta se abre
O mundo se fecha
Atrás de você
Com seus sonhos
E promessas...
O que te resta?
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segunda-feira, 25 de abril de 2016

Afloramentos
Vai chegar uma primavera
Em que não estaremos para ver.
Fico feliz olhando o afloramento
Da paisagem contemporânea,
Que já floriu tantas vezes
Antes de haver olhos a fita-las...
Motivos para explica-las...
Tensão para justifica-las...
Fico feliz em saber que
Haverá primaveras além de nós,
Sem nosso olhar ou nosso
Consentimento... A saber que
A floração não depende
De nosso plantio ou enxerto,
Ou desacerto de ordens
Em nossas escaramuças.
Que não finará o afloramento
Quando finar nosso tempo
Sobrevivido ao susto
De guerrear, humano.
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domingo, 24 de abril de 2016



A vida passa,
E por passar passeia,
Não confunda a sua
Com a alheia...







Fica o dito por não dito,
Que este tipo cheio de razão
É um tanto esquisito...









Maçanetas


Essas pecinhas sem juízo,
Que abrem todas as portas
Mas não as sabem travar...






Como as moscas


As pessoas trombam nas vidraças,
Voltam sempre a trombar
Sem entender o que se passa...








Está chovendo


Está chovendo,
As pessoas se cobrem com jornais
Pelo repentino da aguada...
Olhos amiudados, ombros retesados,
Na voz um soturno inconsolado,
Todos procuram precaver-se
Como se, encolhidos, não se molhassem tanto quanto...
Assim se encolhendo sob jornais...
Pessoas não são como pássaros,
Essas encharcam quando aqueles libertam-se sob essas águas,
Sábios manipulando seus dias,
Escolhendo suas horas
E a demora de irem-se embora,
Embora continue chovendo
Sobre ombros retesados
E olhos amiudados
Porta afora.




Projeções


É tempo de poder levantar-me,
Sento os olhos sobre esse tempo
Passando sob meu olhar pasmo
De o ver passar-me...
Este olhar parado no sempre
A tempo de poder levantar-te.
Das minhas sobras sobrará um tempo
A dar-te, na memória do esquecimento.
É tempo de podermos levantar
Sonhos dormidos
E seguir em frente, mesmo possuídos
Por cada desses repentes,
É tempo de ousar o siso,
Novo assanhamento:
O novo, o porvir, o vento...
A sair do invólucro fechado
E abrir as asas, e voar, e viver o tempo
Que se fez acordado, que à frente
Não há um abismo, projetado
É o infinito no olhar em frente.

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Gerações de geradores


O mundo está posto de ponta cabeça,
Meninos se autodenominam homens
Mas continuam criançando...
Homens caminham cabisbaixos,
Vencidos pelas suas derrotas,
Pelo tempo vivido a cuidar filhos
Que se fizeram antes homens,
Dívidas, multas às excentricidades
Dessa vida modernizada em atos
Que se penalizam por desconhecer
Razões que não compreendem ser,
Por uma geração sem princípios,
Correndo para todo lado, trombando,
Se fazendo tardos... Voltando...
Sem definir bem suas metas,
Metalizando imaginadas ofertas,
Pequeno nacos ambulantes
De uma sociedade a gerar covardes
De uma covardia incompreendida
Aos saltos.






Sei que todas as formas
São válidas,
Mas é-me difícil aceita-las.
O telefone está mudo
Há três dias e não sinto falta,
Nem noto seu silêncio
Quando cala.
O celular queimou e não me falta.
Sinto como não sendo desse século,
Vivo no século dezenove,
Com algum esforço vejo-me no vinte,
Mas,
Nunca nesse balburdio orquestrado
Pelos barulhos de um tempo tenso,

Sem passado.

sábado, 23 de abril de 2016

Além da janela


Além da janela
A vida não passa de momentos
Amontoados sobre momentos.
Vejo a triste situação de Bukowski
E suas putas tristes... Eu, em sendo
Diferente, sou caseiro, de uma só,
Como sonha ele com a calma nossa.
Mas somos parecidos na sensação
Da falta do que fazer sob a chuva,
A mesma, do sol, o mesmo,
Sobre essa memória, a mesma,
Dos tempos amontoados...
Somos tão iguais que dá medo
Ficar lembrando essa igualdade,
Da sua solidão à minha solitude...
Solmizando o amanhã sob sol,
Chuva, na saudade do vivido...
Em vão, a monotonia lembrada
Dos momentos amontoados
Nessa fajuta visão escolada,
De olhos fechados.

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quinta-feira, 21 de abril de 2016


Portas fechadas


Eles estão fechando portas,
As autoridades desautorizadas,
Tentando estabelecer o caos,
Que já se torna quase irreversível.
Os fabricantes se refabricam,
Os vendedores estão vendidos,
Os lojistas tornam-se oportunistas
E tudo se esfarela... em ciscos,
Em trapos de anos suados,
Dispendidos em esforços rasos
De soerguer-se desse lixo.
Em volta o lixo mofa,
Os salaristas perdem o pão de hoje,
Eles fecham portas que
Estão se abrindo, teimosas,
Com a promessa dos ventos...
Tudo sopro... Apenas sopro...
Nada mais que isso
A se respirar o ar impuro
Do mundo político!

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quarta-feira, 20 de abril de 2016

Das tristezas do silêncio

Vou te dar um tempo.
Vou ouvir o que dizes,
Vou sentir na pele
As tuas agonias...
Agora, não erre,
Não diga tolices, abra
Essa conversa
Com o que não disse.         

Que pensar não basta,
Não vale intenções,
Se calas as falas e
Choras as paixões
Apenas com lagrimas
De perturbação.
Então, se abra, diga
Ou cale as lágrimas.

Já te dei o tempo
Que querias silêncio,
Agora caminhemos
Sobre essas brasas
De outros momentos
Sem falar mais nada
Apenas enxugando

Nossas tristes mágoas...
Indiferentemente
Um sol limpo
Na manhã de domingo
Faz de conta que tudo está bem,
Mas falta rezar um terço ainda,
E o apito avisado
Do último trem.
O apetite,
Sempre mais que a panela,
Cheia dos ventos delicadezas,
O que põe à mesa
Na hora da fome
Tem de ter a certeza
Que se come.
Então a vida
Se pronuncia benta
Balbuciando palavras incertas
Sobre o que seria
A tarde aspereza...
Talvez a festa esperada,
A solicitude,
Talvez uma sessão
De bola, amiúde apenas fome
Perguntando delas,
Fluída nelas.
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segunda-feira, 18 de abril de 2016

Livramento


Sonhar
Com a outra parte
Do mistério...
Tudo resolvido
Antes que se acorde
O senso...
Sonhar
Com um momento
Menos tenso,
Com a alegria de poder
Tentar o sustento
Do corpo e da alma
Nesses momentos
Sem calma...









Maratonistas


Atribulado
Com minhas ocupações
De aposentado
Olho esse homens vadiando
Pelo pátio da igreja...
Uns são aposentados,
Outros são desnorteados...
Todos estão desocupados
De suas vidas.
Corro para o banco,
Para o mercado, para o UPA,
Para consertar a TV, as máquinas
De uma casa cheia delas... Em greve!
Fazendo o mesmo percurso
Maratônio de sempre,
Acolho minhas passagens
De ida e volta, agraciadas
Pela terceira idade,
Planejando viajar de novo,
À custa dos passageiros
Que mantive alimentados
Em minhas sete décadas
De lavoro e pena.



Agora,
Quando dormem as águas,
Gelo e fervura se misturam
Na lavratura de nova legislatura.
Por onde olho flutuam sólidos
No líquido óleo formador
De ideias de seres ímpares
Nos plantios dessa terra.
Quando dormem as águas
E alimentam-se homens,
No gelo e na fervura
Se consomem.











Às coisas tristes


A coisa triste
Com a vida bole,
Intensifica-se
E te consome...
Vira e mexe
E mexe e vira
A coisa triste
Mais entristece.
Olhando a água
Levar a vida,
Que fora água,
Que é comida
Quando desagua...
A coisa triste é ver
Entristecerem
As margaridas,
Flores vadias
De nossas lidas.





Ações


Que não se aja
Com exagero,
Mas que aja com
O precisado,
Onde este haja.
Que a precisão
Nos aprece
À falta de melhor
Prece ao esfomeado,
Se apresse,
Não somos privilegiados
Ou desprivilegiados.
Somos uma massa
Que se socorre
Nas agruras de viver
Cada impasse
Passo a passo...

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sábado, 16 de abril de 2016

Vozes do parlamento


A voz que grita
Não me diz nada.
A voz que cala
Me preocupa...
Seu silêncio pode seja
Anuência ou desavença.
Sua falta pode seja
A paz imerecida.
Cá estamos,
Entre risos e ranços,
Ouvindo do silêncio
Essa raiva...

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sexta-feira, 15 de abril de 2016

Digitais


Essas sujas paredes marrons
Amarelas...
Essas letras comestíveis
Sobre elas...
Essas mãos de crianças, carimbadas
Nelas...

Uma incondicional deferência:
Todas se curvam à mão da criança
E de seu chocolate amargo
Nas terças de madeira e prego

Vistas arranhadas pelas rodas
De suas bicicletas
E tomadas ousadas...
E mãos frenéticas...

Tudo isso é uma cena que passa,
Que lembra um tempo que passa,
Que faz uma lágrima, que fica...
E abraça.


Fim de baile


Talvez seja propício historiar
O imprevisto das horas doce-amargas...
Assim o canto não sai de ser um conto,
Mas dói como a levada cansada
Das pernas frouxas de viandar...

Talvez o choro extravase a alegria.
Talvez agora a mão indecisa se firme.
Talvez o momento seja promessa.
Talvez eu já não tenha a pressa
De sorrir ou chorar, de brigar...

Talvez o hoje seja a razão de voltar
Ao mesmo lugar de ontem, de antes,
De nunca ter saído daquele não lugar,
Embora viajado infernos paraísos
Nos momentos depois do juízo.









Talvez o depois seja o já vivido e
O agora a proporção de nadas
A mensurar os possuídos valores de
Antes de regrar as mãos e os pés,
Antes de dizer à que se vai.

O canto capaz de sonhar-se poesia
Entre uma palavra vazia e um penar,
Monótono, mas interessante de pensar.
Talvez por isso a mão tremule,
Não o adeus, a lonjura do adeus.

As fases passadas na vivência
Veem chegando devagar ao gesto,
O gesto emperra pensamentos
Num apenas vulgar sentimento de
Choros convulsivos... Ou risos.








Talvez agora o riso seja felicidade,
Mesmo que tarda, mesmo que lisa,
Como a face enrugada lisa da velhice
Moldada nas horas de espera
Pelo chão que vai sumir... Sumindo.

Aí sim, talvez a mão seja a extensão
Do abraço, e o traço, ah... O traço
Seja traçado num papel em branco,
Outra vez redesenhado para sorrir
O choro das intenções divididas.


Embate


Ouço tua voz distante
Como quem se despede
Antes de chegar...
Ouço tua respiração ofegante
Como quem corre
Adiante desse... Hangar.
Mas assim é nosso momento
Cravado de entristecimentos
E o desespero... De navegar...
Sinto teu coração alardo,
Ainda me pedes se posso
Um último verso... Amargo.
Mas como podemos comungar
Nossos defeitos se tu vês
O que vejo d’outro jeito?
 
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quarta-feira, 13 de abril de 2016

Aleives

Não me creia vero,
Não me veja histérico,
Não me saiba compreensivo
Aos erros...
Quando estou dormindo
Sou sincero...
Quando esbravejo
Estou ainda calmo...
Descarrego o que não sei
Guardar em silêncio,
Extravaso o que sinto
No momento.
Não me creia calmo
Ou histérico,
Quando durmo
Sou sincero.





Então é isso?

Então é isso:
Este tempo não faz sentido,
Não trazem louvores essas novidades
Quando vejo agredido o ser humano,
Ou animal, vejo o que é isto:
Que vida fica da vida que passa?
A que pacifica















Cesto de costura


A doméstica feitura nos botões
Remendando joelhos e vidas rotas,
Procurando nas agulhas o sermão
Ainda que gasto de vivido,
Visto e guardado
Com as coloridas linhas de bordar.
Esta cesta de guardadas estórias
Que a história não irá contar...
São as vísceras do boi e do cavalo,
Estendidas pelos lobos no quintal...
A lembrança desses uivos noturnos,
Assustadora ideia de ser mais.
Mas a fome é maior se costurada
Entre botões e linhas, e memórias
Dessas vidas trazidas lá de trás,
De onde vicejam ainda agora
As vontades idas de remendar.
Todas as formas ainda são válidas
De coser as roupas e as almas
Envilecidas pelo tempo de ficar,
Como se fora outra vida
A deixada para trás,
Costurada nos dedais...
Bródio


A história
É servida na bandeja.
Como uma cabeça de porco,
Partes que ninguém quer
Vêm aos poucos,
Aos pedaços, com seus pernis
E seus torresmos e farofas.
A história se historia
Nos comensais famintos
Entre banquetes e sobras,
Como a cabeça do porco
Servida aos demais...







Nova ira

Neste momento,
Em que a vida está difícil
E a morte fácil,
Os tangidos se esfacelam
Em cordos
De força e regalo...
Tiros perdidos e chicotes soltos
Pelas tardes de faca
Nos pescoços...



terça-feira, 12 de abril de 2016

Dias tristes
Hoje é um dia triste,
Triste de saber-se nulo
Ante as opções de mando.
Triste ante o voto nulo pela farsa
Dos elegidos ontem.
Triste de poder-se mais
E anular-se nisso...
Hoje é um dia
Que poderia ser de paz,
Mas a paz asila-se nos atos
E desatos de compra e venda,
De dar-se à venda sobre olhos xoxos,
Sob discursos mofos...
Ante olhares vagos
De canalhas frouxos!
Hoje é um triste dia,
A passar-se a régua e seguir adiante,
Para dias menos tristes,
Se possível, mais alegres...
Menos tronchos por poder-se menos
quando mais pudendos
Forem nossos votos de um dia ameno.
Honestamente ameno
Sob palmas... Ou silêncio.
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segunda-feira, 11 de abril de 2016

Sem destinos
Do livro Teceduras

Os movimentos se levantam
Mas a casa não se acorda,
Dorme, como se fora morrer
O sol outra vez na mesma janela

Outra vez o mesmo perguntatório:
-quantas manhãs se passaram
Desde a revolução daqueles cravos
Nas lapelas dos usurários?

Os movimentos se levantam,
Partem para as jornadas
Como fora um outro obrigatório

A percepção dos nadas de hoje,
Repetidos nos nada de ontem,
Nas dúvidas de sempre...


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sábado, 9 de abril de 2016

Toques


O que me toca toco adiante.
Com a itinerância dos projetos
A planta baixa explicita
Que o sonho realiza o certo:
Uma pá de cimento,
Outras de cal, areia e ideias...
Passem adiante o que faremos
Com esse imaterial material
E uma mãozinha à meia.
O que te toca, toque adiante,
Arrebente muros velhos,
Velhas opiniões errantes...
Uma pá de ideias mais a cal
Cimentando o teu ideal:
Uma estranha forma de ser

Humano, embora animal.


Eu me divirto
E me advirto
Com ideias
De fuxicos...









Por mim não se amofinem
Que eu tenho sonho completo
De ser o mesmo no fim
Desse nosso trajeto...






Algumas coisas


Alguma coisa me diz
Que a sorte assim dispôs:
Eu, como mero aprendiz,
Vou deixando pra depois

A sorte eu mesmo fiz
Com a vontade de por
Cada coisa em seu matiz
Cada sonho que se for

E quando perder de vista
O que a sorte me prediz
Quero voltar a sentir
O doce em meu nariz

Que eu, mero aprendiz,
Fui adiantando o depois
Do que a sorte me diz
O que o real me propôs.


A face oculta


É na imaturidade senil
Que pessoas se tatuam,
Alguns depois de certa ida,
Como fossem emplacadas
Propagando fé, amor, ódio,
Quiçá o ímpeto pensar-se
Breve como eterna carga,
Que se fez leve e pesada
Num primeiro momento
Dessa caminhada...
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Dúvida à questão de ordem


Duvido
Que o singular,
Às vezes seja tão plural:
Do alto dos meus anos
Um verão seja tão mais...
Do baixo do meu ânus
O vosso seja pluralizado...
Que duvidar seja passivo
De ser possível olvidar...
Que o possessivo seja
Estranhamente normal...
Mas sempre, ou quase,
Não tenho essa razão:
O arrazoado é razoável
De se o questionar...
O impugnável pugna
A última palavra?
-Duvido!





Quando estiver escuro


Quando estiver escuro
Certifique-se que é geral,
Que o sol se pôs a pouco
Sem que tenhas percebido,
Que o bate estacas quietou-se
Na construção ao lado
E não perdeste o sentido.
Quando te estiver escuro
E todos estão no claro,
Então o escuro está em ti,
Preclaro... Em suas vísceras,
Em suas almas, emoções
Dilapidadas pelos medos...
Alguma causa incausável
Te faz segredo.
Cuide-se, faça alguma ação,
Um gesto de animação,
Um grito, um silêncio,
Para em ti clarear-se
Esse sol se pondo
Depois do susto.


Politicamente


Não se iluda com
As versões da verdade
Porque todas as mentiras

São de verdade.

sexta-feira, 8 de abril de 2016

Ecos


Ecos são respostas
Às propostas soltas no ar,
No tempo dos sonhos lindos,
Nas decepções de não se realizar.
Ecos vinculam-se aos sons,
À fala mansa, à fala braba,
Aos gritos de festa ou desespero...
É preciso ouvi-los responder
Aos apelos.
Ecos respondem a desgraça,
Apenas sussurram
O que pode ser verdade, ou não,
Apenas respondem à conveniência
De celebrar o diálogo,
Ou perde-lo na vasta, na imensa
Resposta ao ato desmedido,
Fraco, ostensivo, furtivo
Ao tato na estreita greta
Entre o sonhado viver
E o vivido ser.

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