quinta-feira, 25 de junho de 2020


Idos

À quantas está
A vontade de viver?
A dor que se fez
Por merecer
Já não dói como
Prometera doer...
Descubro, enternecido,
Que sou mais vivido
Que o tempo
De meus idos...





Cofiado

Caminhemos...
Caminhemos...
Quem sabe inda
Cheguemos
À esperada estação...
Foi de lá, de muito tempo,
Que se cofiou as eras,
E as eras, passadas eras,
Se converteram
Em momentos
De espera...








Eterno eito

Depois
Da próxima lua
Se verá o próximo
Eterno eito,
E de lá,
D’onde falhamos,
Seremos outros
Caminhantes,
Bem como antes...










As tabuas da varanda

Ao sol posto
Nas tabuas da varanda
Contam estórias de vidas,
As rugas traem o momento,
Décadas vividas
Em desencantamento...
Ali se chorou a falta,
A vinda, a ida, a de volta
Entreunida...










Num fechar d’olhos

Num fechar d’olhos
Outros quinaram
E estarão aqui,
As casas novas festejam,
As velhas casas oram,
Os olhos que vêm a morte
Olharão de lado
A ver repor nova safra
Sem tempo de rezar os que vão
Ou festejar os que chegam...
Num fechar d’olhos
A cena muda, e muda
Ficará ao tempo
Da muda...





Gangorreio

Maré alta,
Maré abaixa,
Gangorreiam
Ao mar solto
E batem quinas
Nesse porto...
Mais dia,
Menos dia,
Terão contado
Às favas de maria
E seu esforço...








Atrapalhos

Houve um tempo
Em que eu não tinha dores,
Aliás,
Elas eram esporádicas...
Há um novo tempo
Para um velho conhecedor
De dores...
Faz parte da longevidade
Surgirem novidades...
Agora já não posso
Mais do que posso...
Embora possa esperar
Outras contingências...
Acomodo-me nessa espera
Como antes não acomodara...
O desalento é lento
Mas veio para ficar,
E atrapalha...

Oblações

Quantas ofertas
A vida tem para ofertar?
São quimeras e arestas
A nos perguntar
Sobre possibilidades
E vontades...
Que não podem mais.
Quantas ofertas
Os hotéis nos proporcionam
Viajar... viajar...
Como?
A letra mal ilustrada
Nos mostra de perto
Este abandono...





A hora da verdade

Nalguma hora,
Pendurado nas verdades,
Cala-se a aspereza
Avizinhada...
Ao sol do meio do dia
Ou ao luar do meio da noite
Acordados somam valores
E se sobrepõem às dores,
Daí a verdade assoma
A vontade de seguir,
Tanto quanto de não ir,
Vai-se pela estrada
De altos pinheirais
Sem meias palavras
Ou meias mentiras,
Apenas a verdade resiste
Ao correr das águas...

sergiodonadio

sábado, 20 de junho de 2020


Quando amanhece

Traçando planos vários
Para o dia amanhecido
Entre feitos da vontade
E o sonho desasido
Das figuras dessa tarde...
Quando amanhece vou
Num caminho desusado
Perscrutando o pio longe
Da rolinha empenada...
Na desova na janela
Confiou sua morada...
Invejo a liberdade
Desses voos dela...
Vai, rolinha, contigo leva
Meu sonho de morada...



Sergio Donadio e outros autores    32    Editora Palavra é Arte - Poesia na escola

  “A poesia ilumina a sala vazia com sua luz acesa
na palavra dita, é a luminária diáfana a acender a chama
que se reedita cada vez lida. A palavra, ah, a palavra não
se apaga, vide as vozes dos Poetas de há milênios, nunca
apagadas, a clarear nossos dia
Sergio Donadio e outros autores    32    Editora Palavra é Arte - Poesia na escola

  “A poesia ilumina a sala vazia com sua luz acesa
na palavra dita, é a luminária diáfana a acender a chama
que se reedita cada vez lida. A palavra, ah, a palavra não
se apaga, vide as vozes dos Poetas de há milênios, nunca
apagadas, a clarear nossos dia
Sergio Donadio e outros autores    32    Editora Palavra é Arte - Poesia na escola

  “A poesia ilumina a sala vazia com sua luz acesa
na palavra dita, é a luminária diáfana a acender a chama
que se reedita cada vez lida. A palavra, ah, a palavra não
se apaga, vide as vozes dos Poetas de há milênios, nunca
apagadas, a clarear nossos dias...
Nonsense

O plano
Que escapa da realidade
Não atravessa o dia,
Despedaça...





Deixa o dito
Por não dito
Que o dito se
Esquece disso...





A hora e a vez

Brotam lágrimas
De saudade
De um tempo aliviado...
De um termo ultrapassado...
A hora e a vez são a vez da hora
De chorar ou sorrir à que
A lembrança aflora...













A vontade se esgarça
Com a premente dor
Apurando o fato...







A criança de hoje adolesce cedo
E mantém-se assim deslumbrado
Até que lhe bata a verdade...





Do animal ao animalesco

O asco ao animalejo
Trazido à corda esticada
Produz arrepios ao medo....
Quem pode medir o erro
De pulsar ao intermédio,
O cão, à vista do homem,
Por medo rosna e ataca
Prevendo o chute no saco,
Irraciocina seu intento,
Vaga entre corda e lenço
E faz do medo bravura...
O animalesco murmura
E tasca pau na lonjura...





As putas também têm alma

Tempo das charretes
Que traziam e levavam
As putas da cidade...
Tempo de espionagens
Pelas janelas dos fotos
Onde as putas fotografavam
Seus perfis,
Escondidos nas paredes
De seus quartos...
Longe dos olhares das senhoras,
Talvez por inveja as odiavam...
Os senhores beatos se escondiam
Quando passavam as charretes
E no escuro sem lua
Arrastavam-se aos lupanares...
A hipocrisia já aprisionava
A sociedade...

Obscuridades

A cor das estrelas
Depende de cada olhar...
O vesgo a vê enviesado,
O apaixonado com paixão,
O distraído nem nota
A distância de cada olhar...
Mas se a nuvem as cobre
Como saber das cores
Que cada olhar olhava
Antes da embaçada?








Resistências

A vontade não tem nome
Nem é endereçada a nada...
A vontade toma de conta
A hora errada...
Pode seja cedo para a tarde,
Pode seja tarde, inda cedo,
A vontade inspira e abate
O sentido do tempo...
Em plena madrugada tive
Vontade de comer caju,
Mas era tarde... Nesse tempo
Só era de tangerinas...








O tempo vário varia
Entre choro e alegria...







Não se iluda,
Tudo é provisório,
Constantemente
Em muda...





Empatias

O que às vezes
Contorna as verdades
Parece bastante com o rio
Entre pedras lisas...
A natureza imitada
A cada passo das gentes
Faz enseada brilhante
Entre folhas adelgadas...
Como os mentirosos
Brilham suas entradas
Contornando pedras lisas,
Pelo tempo, alisadas...






Vicissitudes

Os fatos que se sucedem
Apenas mostram caminhos...
Não obrigam a segui-los...
A mão que talha se serve
Dessa variação imberbe
A comungar escaninhos...
João se fez de menino
Quando chamado a crescer,
Espiando outros ninhos
Deixados acontecer...
Os fatos, assim se sucedem
A cada amanhecer
Criando normas exauríveis
Que tendem a fenecer...









Motivamentos
Escrevo
Para que me aperceba
Das continuidades,
Plenas ou desiludidas.
Inda ontem audaz
Num possível convívio
Com as transas da tarde.
Hoje sou verdade.
-Intragável? Como todas
As necessidades deglutidas
A cada mastigável lida.
Que é feito dos momentos?
Um tanto choro, um tanto riso...
As memórias redivivas
De um escrevinhador
Ambicionando O impossível.
Se não doesse tanto
Não seria vida.
sergiodonadio

segunda-feira, 8 de junho de 2020


Essas crianças sem teto

As vejo feito anjos,
Essas crianças sem teto
Em seus trapos sujos
E semblantes tristes...
Mas com uma paz na alma,
Que não encontro n’outros...
Essas crianças sem teto
Deveriam ser a consciência
Dos que roubam delas
Algum conforto...
Essas crianças dormem
Num colo seco desvairado...
Aturdidos pela fome mínima
Na penúria do trato...
Essas crianças sem um teto,
Expostos, como brindes,
À desolação dos que lhes
Roubaram os sonhos...


Composição

Este mundo terra
É feito de vegetal e água...
Aí o reino animal
Se intromete
Com suas renas e macacos
Suspensos nas galhadas
E gramados
Guiados pelo bicho homem,
Tendo-os predado...













as pessoas querem
remarcar o princípio dos dias,
mas nada acontece,
a marcação dos dias é só de idas...







Com alguma esperança

Vendo como os jornais
Contam os mortos pelo coronavirus
Sinto pena dos esquecidos... Procuro,
Na paralização comercial,
Detalhes de como sou afetado,
Encontro cabelereiros, manicures,
Na outra ponta fundições e serrarias,
Em nenhuma encontro variações
Para os espetáculos, fora teatros,
Cinemas, abrangentes faces...
O circo não aparece prioritariamente,
Com suas milhares de lonas,
E trinta mil desocupados!
Trapezistas e palhaços viram equilibristas, como outros ramos
Sem conquista... Alguns suicídios
Não serão contados nessas listas,
Onde se perdem vidas...
 Expiação

Vislumbro pessoas
Com suas máscaras
Atravessando o tempo
Perdido pela massa...
Espio meninos
Não indo para escolas,
Em aulas virtuais...
Vislumbro meninos
Sem colégio ou forma
De estudar online...
Aflitivamente expio
As dores desses,
Que olham aqueles,
E perdem de vez
A esperança na espera
Por algo mais...

sergiodonadio



Todas as minhas mãos

Estão ocupadas
A levantar bandeiras,
Da realidade ou dos sonhos...
Todas as minhas mãos
A acenar aos planos
Inda não levados a sério...
Que se confundem
Com o revertário...
Todas as minhas mãos
Espalmam palmas
A cumprir jornadas...
Todas as mãos,
Exceto as minhas,
Fazem-se advinhas...
Que o canto vem de longe
E se aninha




As ideias dito novas
Estão veladas
À parição dos nadas...





Intenções

A palavra fere a palavra
Quando se diz preocupada,
Quando aflitiva, malsinada,
 Até quando nada...



sexta-feira, 5 de junho de 2020


Viageiro

Saio de minha terra,
Casualmente,
Mas minha terra
Nunca saiu de mim...
Sei que é uma frase de uso,
Mas em mim cala fundo...
E faz voltar ao princípio,
Perto do fim...
Então, fica valendo
A conversa de outros
Antes de nossa compreensão
Da lógica desses
Em mim...







Cautela

As pedras são cautelosas,
Deixam-se levar, eclodidas,
Para tornarem-se novas vidas...
A fragilidade enganosa das pedras
Ante a afoiteza de nossos sonhos,
A aglomeração em nossos anéis
Entre colares e fitas coloridas...
As pedras perduram ao tempo
Vencido pelo relento
De pessoas e guaridas...












O que o tempo nos mostra
É o tempo perdido
Entre o que tem para viver
E o que nos foi vivido...






  
O termo “meia idade”
Deveria ser o meio da vida
Mas é a saudade do que parte
Na medida do que fica...





Aparências

Aparentemente
Estamos felizes, ou não,
Com a chuva instantânea
A criar raízes em nosso chão...
Mas não deixamos de observar
O ninho que a rolinha fez
Em nosso banheiro à mão,
Chocou duas novas pintainhas...
Essas vidas revivendo vidas
Independentes de nossa opinião
Fazem gerar nova atenção
Ao termo aparentemente
Sem explicação...







Quando todos forem embora

Será possível meditar
Sobre as desculpas tardias...
Sobre as promessas dos dias...
Sobre o que há de ausência...
Quando se forem as peças
Dessa cristaleira quebrada
Sentiremos nos cacos soltos
A precisão de motivos...
O término de jornadas...
Um fio de história vivido,
Quase nada...









Essas crianças sem teto

As vejo feito anjos,
Essas crianças sem teto
Em seus trapos sujos
E semblantes tristes...
Mas com uma paz na alma,
Que não encontro n’outros...
Essas crianças sem teto
Deveriam ser a consciência
Dos que roubam delas
Algum conforto...
Essas crianças dormem
Num colo seco desvairado...
Aturdidos pela fome mínima
Na penúria do trato...
Essas crianças sem um teto
Expostos, como brindes,
À desolação dos que lhes
Roubaram os sonhos...


Composição

Este mundo terra
É feito de vegetal e água...
Aí o reino animal
Se intromete
Com suas renas e macacos
Suspensos nas galhadas
E gramados
Guiados pelo bicho homem,
Tendo-os predado...