domingo, 29 de março de 2015



Dos solares


A luz impregna os meios,
Estamos a confabular esteios
De outra forma, senão virgem.
Apenas a florada em meio
À turba que invade e arrepia,
O tempo de procura te procura,
Caminheiros juntos nesse leito
Entre as queimadas verdadeiras
E aquela à que estou aceiro
No dia que termina inda no meio.
Receoso cultivo esse receio
De que as folhas mortas invertam
A nova primavera
A queimada das razões arrasa
O anseio de sermos em vão
Parceiros do que não veio.
Das tantas almas em que
A vida é feita sorte
Quero deixar para outro
Pensar a morte.






Vendo o que fazem
Com o que lhes é dado
Concluo que cada um
É seu próprio carrasco...










As almas simples
Fazem do resto
Rostos...






Consignes
Do livro enlevos

Os anjos da noite esperam
Que durmam as vontades
E a sono solto abrem-se
Em planos de felicidade...
O medo faz com que
Não nos vejamos um no outro,
Mas somos de mesma
Identidade...
Nascidos já desmamamos
Logrando fios de idades...
Se a finalidade foi conquistada,
Por que a abandonamos
A esses anjos da maldade?
Supridas vossas vontades,
Geridas outras vontades,
Feridas as necessidades...
Vendo o que fazem
Com o que lhes é dado
Concluo - Que cada um
É seu próprio carrasco...
Dentro dessa maldade.

Sergiodonadio.blogspot.com
São teus olhos


Aos teus olhos
Meu rosto amadurece...
Façamos nosso mundo
Desses momentos...
Sem pressa no entendimento
De que somos pares,
Somos partes,
Somos ímpares nos cantares
De nossos ninhos,
Aninhados somos dois
Ambos num só
De imediato.











Bem aqui


Quando
Você deixar de partir
Encontrará teu lugar
De ficar.
Esta é a hora


Esta é a hora
Em que a tarde assoma,
Fulguram esses raios de um sol
Pondo-se, iluminando a grama.

Esta é a hora
Em que o pêndulo pende
Para o escuro do fim dos dias
Elaborados frios em alguma reza.

Esta é a hora
Em que a tarde assoma, as putas
Se revezam noctívagas
No escuro dessas vidas.

Esta é a hora
Da vã promessa de uma nova sina,
Em que os pais sentam-se à mesa
A ouvir aventuras nesta tarde,

Esta é a hora,
A mesa é posta novidades.
Depois que todos dormem
Viram vampiros...

Esta é a hora
Em que se deitam refestelados
Postos a cunhar frases,
Desculpando erros.

Esta é a hora
Desesperança de que foi o dia,
E os dias de entremeio
Num café amargo...

Nesta hora
Sem nada mais a conviver
Palitam os dentes, a mesa,
Num grau de incertezas.

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sexta-feira, 27 de março de 2015



Notícia de jornal
Manual do Mundo: Como enxergar sua própria voz (experimento de Física)
À pergunta:
-De onde vem inspiração?
Diria:
-Pode ser da notícia...
Num experimento de física
Tirar o verso embutido:
Enxergar tua voz.
Ouvir teu grito...
Promover daí um alarido!
Sentir tremer o sentimento
Num profundo sentido...
Ouvir pensamentos...
Tocar a mão auxiliadora
Da razão, palpa-la,
Resumi-la ao fragor
Da expressão de fala!




Trago comigo
A sobrevivência dos ponteiros
Esperando
A subida para as nove,
A descida para as três...
Paciente como a aranha
Espera a mosca,
Espero a moça de trejeitos
E formas...
A ideal, a perfeita.
Assim somos de dois gêneros,
Curtindo a paciência
dos ponteiros...










Aedes aegypti


Estamos arcados na janela,
Sobreviventes da perdição dos tempos,
Dependentes dos valores falsos
Do dinheiro que atravessa oceanos
E impõe a cotação dolariana
Desfeita em derrotas,
Contas fantasmagóricas,
Incidentes sem Antares...
Uma pá de cal sobre os problemas
É o resultado de exames médicos,
Que nos fazem, além de avaros,
Deficitários na derrota para essas
Moscas coloridas do Aedes aegypti
Silenciosas sem o zunir de pernilongos,
Mais ferozes...
Fica a dúvida: como voam
sem bater asas?


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Freios


É um encontro difícil,
Pesado,
Vertiginoso
Quando se espera pela poesia
Contida nos desacontecidos...
O silêncio cortado pela freada
Do trem em seus trilhos de ferro
Não ajuda,
O pio de fome do pintainho
Não ajuda.
O latido do cão à passagem do gato
Não ajuda...
Tudo poderia ser um encontro,
No mais das vezes desencontro,
Com a poesia, contida no silêncio.
Inda acordado após o freio do trem
No fundo da alma.









Não... Não estou solitário.
Estou em silêncio porque
O silêncio é necessário...









A vista, do alto da ponte,
É magnífica...
O salto do alto da ponte
É que é suicida...







Não falamos a mesma língua


Eles não sabem disso,
Estou com setenta anos,
Eles com trinta e poucos...
Eles não têm ideia do quanto
Demora o dobro do já vivido
Por eles...
Não sabem que é muito mais
Demorado
A segunda parte das dezenas
De anos contados
A partir do nada.
Mas também não têm o prazer
De assistir erros crassos
E rir disso agora...
Mas também não conhecem
O prazer de errar
Tantas vezes...
Eles não sabem de nada,
Não sabem dos nada...
Até aprender.



O violino


Eu tive um violino...
Já tive um violino
Como alguns
Têm cachorros,
Já tive um violino
Como se fosse
Toca-lo um dia...
Mas nada deu certo,
Eu fiz os solfejos,
Fiz as escalas,
Fiz as posições...
Mas não deu certo.
Eu tive um violino
E perdi-o na derrota
De não poder
Sabê-lo.





terça-feira, 24 de março de 2015

Cemitério de automóveis

Do livro enlevos


Os carros amontoados
Em um ferro velho
Tinham vida, traziam pessoas,
Levavam notícias, partos,
Partidas...
Quase todos estão batidos,
Abatidos, lesados,
Seus ocupantes feridos...
Alguns mortos,
Cruzes sem nomes,
Estendidos neste pátio.
Deveres descumpridos,
Alteração de hábitos
Em cadeirantes , mumificados
Autores desses estragos...
Estamos vendo o sol
De suas grades, penitências
De suas chagas não visitados
Pelos em luto.
Há uma incorreta ligação
Entre as formas de viver
E as mortes em tentando...
Corroídos pelos vícios
Alguns se matam antes,
Outros têm a paciência
De esperar a natureza,
Mas em verdade
Todos se destinam,
Em algum lugar, algum momento,
Por motivos insalubres,
Mesmo os que se prezam sãos,
A apodrecer em pé.

segunda-feira, 23 de março de 2015



Anos a fio


Surpreendo-me
Sentado na historia
De uma vida,
São cabelos brancos,
Barba branca,
Memória branca
De idas passagens
Dessa vida
Sem alardes.


O trem partiu,
Perdi a partida,
Uma câimbra
Me segura
Despedida, e,
Nada pior neste momento
Que ter uma câimbra
E perder o trem
De uma vida...





Dedais


Considerando
As mãos
Com seus dedos
Predadores

É melhor
Que não avancem
Entre as unhas cortadas
E o sangue derramado
Nelas.

Seria um morticínio se
Os dedos pensassem
Como o cérebro,
Que age devagar e
Conscienciosamente

Segurando
A predação dos dedos
À frente
Dessa batalha




Amabilidades


Quanta amabilidade...
Ler e reler essas folhas
Vazias...

Quanta amabilidade
Responder a perguntas
Vazias...

Seria muito esperar
Sinceridade na amável
Resposta vazia?














Digitais


Essas sujas paredes marrons,
Amarelas...
Essas letras comestíveis
Sobre elas...
Essas mãos miúdas,  
Carimbadas nelas...

Uma incondicional
Deferência:
Todas se curvam à mão da criança
E de seu chocolate amargo
Nas terças de madeira e prego

Vistas arranhadas pelas rodas
De suas bicicletas e ousadias...
E mãos frenéticas...
Tudo isso é uma cena que passa,
Que faz uma lágrima, que fica...
E abraça.

Sergiodonadio.blogspot.com



Âmago


Se vês um estranho
No espelho,
Espera, volta ao dia
Feito brasa...
Confira as mágoas,
As dragas,
As manadas...
Verás que teu espelho
Apenas espelha
Teu tempo âmago.