sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Escritos na areia


O vento
Escreve na areia
Algum recado a nós,
Inelegível…
Analfabetos nesse idioma simples
Onde
Se entendem
Vento, areia, céu
E mar…










O passar do tempo


O tempo passa,
E por passar passeia
Redutos íngremes
De cada coração…
Que resposta daremos
À dúvida torta
Se palmearmos cada passo
Nesse chão?
Que vida rescender ainda,
Já fraco o fogo,
Feito este carvão?
Todas as formas,
Dedicadas ao eito,
Foram em vão…
O tempo passa,
Sem reza de compaixão,
Apenas o olhar perdido
D’outro irmão.

Se puderes saber


A palavra mais bendita
Pode seja Amém…
Mas
Às vezes a palavra que consola
Se enrola
Em sílabas mortas
E se torna xingamento…
Em silêncio.











Quando tiveres medo


Procuro, enfim,
Os meus medos,
Quero-os aqui enfrentados,
Se forem assustadores
Os quero mansos…
Quando tiveres medo
Procura a cauda longa
De teu medo…
Os meus os encontro
A cada passo dado,
Ou retido nesse
Espaço.







No fundo da noite


No fundo da noite
O assobio assustador do vento
Acorda
O dormido sentimento
De planuras…
No fundo da noite
O ruído acorda o senso
De maturidade,
Já sem medo desses escuros
Que abrangem a paisagem.
Outros escuros
Invadem nossos medos
No fundo da noite
Que aparte…





Pequenos consolos


Alguns objetos
Lembram pessoas…
O senhor com suas chaves
Pendendo da cintura,
O banco num jardim
Anunciando adverso
Lojas há muito fechadas…
Uma estrada… 
Feita de arbustos tiriricas
Fechando as saudades…
A senhora enviuvada
A morrer de velha
Entre as quinquilharias
De sua espera…
O senhor das chaves
E sua inutilidade
Nessas portas abertas
Aos velórios tardos
Desses moços áridos…
Sedimentos


Quando não ouço noticias
A poesia fala;
Quando recebo notícias
A poesia cala.















Bafejos


Sofrimentos passados
Acordam ao sentir-te fraca.
Aqui somos o dia, ontem, amanhã…
Quem sabe inda passarinhemos junto
As asas de nossos sonhos de antes…
O silêncio vem acordar
O último prazer da espera,
Aflando o olhar surpreso,
O coração ao inesperado,
Momento de presenciar-te
Como eras antes desta tarde,
Espera…







Cansaços


De onde conheço
A pessoa que me fala
Dos longes?
De antigamente?
De alguma entre sala?
De onde conheço
Este falar cantado?
Este olhar enviesado?
Talvez de alguma viagem
Entre o aqui e o agora…
Ou entre aqui e outra hora…
Sem saber se sabes
Que sou outra pessoa, agora,
Outro olhar o horizonte
Com essas rugas na fronte
E na alma…



Depois de lidado tempo


Contorno as vias dos fatos,
Da luz reflexa à sonolência
Nas madrugadas…
Do canto vário ao choro válido
Na proporção dos ares
Das messes áridas
Depois de lidado o tempo
Lembro sombras que assombraram
As luzes de meus vazios horários…
Pantomimas, velórios, causos 
D’onde essa vontade partir de novo.
De novo apenas floresce
O não plantado depois de lidado
O tempo reflexado
No tempo ovário.



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