quarta-feira, 9 de outubro de 2019


Saudade ruim

Essa,
Que faz a gente lembrar
O que a gente quer esquecer...






Não se faz necessário
Por os pingos nos is
A cada controvérsia,
Cada pingo tem seu i...




Concessões ao concessivo

Pode muito bem
Claramente
Ser um golpe...
Se, de repente,
Anuviar-se o céu
E parar-se a lua
Em detrimento
Do que flutua...









Este vulto que passa

Este vulto que passa
Entre o batente e vidraça
 Pode ser o último soldado
Nessa luta desigual
Dos dias amargos...
Ser o fim da festa
Ou das alegrias
Pode ser a tristeza
Das nostalgias...








De mãos abanando

O povo ficou
De mãos abanando
Um triste adeus
À espera da esperança...
O povo é que sabe
A dor de parir
Um estranho ser,
Entre ignóbil
E de feiticeiro aprendiz.
O povo não sabe
O que vem primeiro,
A vergonha
Ou o dinheiro...




Abrigos

Procurados por mendigos
Para um pouso...
Procurados por letrados
Por um prêmio...
Procurados por empresários
Por um lucro...
Abrigos... Abrigos...
O que nessa vida troncha
Vale mais?








Não aprendi a gostar

Não aprendi a gostar
De chatas anedotas velhas,
De velhas anedotas novas...
De falhas na poetização
Fraca de fracos ritmos...
Quero aprender a gostar
De recitais infantis
Nos jogos florais...
De quando crianças
Decoram textos
E se fazem aplaudir...
Quero aprender a ver
Iluminuras
Na sombra enfeitada
Das aparências...


O dia em que eu me aprendi

Eu estava um senhor polido.
Me estranhando ser tão polido!
Quando acordei para as horas passadas entre lenhadores,
Brutalizados pela permanência
Entre ocasiões embrutecidas...
Eu já havia estado frio
Calculista naquela arena,
Feita de poeira ou barro,
Chão escorregadio
Como as putas da noite...
Um caso à parte de moçoilas
Servindo mesas no hotel,
Que à noite diziam sem pudor:
-“Agora vamos trabalhar de puta”
E saiam pela pequena vila
À procura de caçadores...


Com a naturalidade
Como que iam à missa de manhã
E a complacência dos pais delas
E dos senhores à mesa do jantar.
Eu estava um senhor brutalizado
Nessa época de caças predatórias
E de cortes de uma mata alternada,
E de meninas que deveriam ser inocentadas de tudo...
Por essas situações de abandono
E pelas facas afiadas
Que vitimavam bichos e pessoas
Com a mesma insensata embriagues,
Eu estava anestesiado, talvez,
Pelas ocorrências sem pudor
Das faces embrutecidas
Calcadas no carvão das lidas...


Se previna,
No tempo contado no relógio
Os bilhetes são todos
De ida e volta...





As fatalidades
Se resumem
Em quase tudo,
Ou quase nada...




Todos estão lá fora

Todos estão lá fora,
Batalhando ou se entregando...
Fora de mim
O alvoroço é tópico.
Não me sei apto
A lutar essa batalha,
Então me escudo entre toalhas...
Todos estão lá fora
Correndo em direções opostas,
Mas com o mesmo intuito:
Deixar ferver o outro
E sair assobiando
A mesma canção distraída
Em ritmos diferentes...
Todos estão lá fora
Esperando a nova aurora...

Na passagem do tempo

Talvez com a passagem do tempo
Possamos unir vocações sinceras
Em torno de objetivos reais...
Não como nos dias de hoje
Em que se comprometem horários
E se descomprometem
Com a desfaçatez anormal...
Sem ao menos um telefonema
Com alguma esfarrapada desculpa.
Talvez com a passagem do tempo
Os meninos voltem a ser meninos
E adultos se comportem como adultos.
Talvez quando todos faltarem
E as vidas se tornarem um caos
A geração crie juízo
Para não se solver em siso...



O que existe
No ato de ser triste
Além da tristeza
De estar triste?





Eles estão lá fora
Analisando suas derrotas
Eu não quero ser
Essa anedota...






Quando as decisões
Já decididas
Ainda merecem
Reticências...





Sentimento,
O dia em que o gato
Perdeu as botas...





CENAS POÉTICAS

A poesia não escrita,
Representada na paisagem na janela,
Mostra caminhos afora...
Pelo embalanço da cortina,
Pelo canto choro
Do passarinho nascituro,
Dependendo da hora,
Até pelo velório ensimesmado,
Pelo diuturno céu azul mesclado...
A poesia inebriada
Da voz infantil da petizada
Em fúria pelas ruas...
Sim, a poesia se expressa
Em formas desalinhadas...
Até pela palavra!
sergiodonadio

Ninguém notou

Descrevi em mil palavras
As peripécias de minhas lavras
Minhas lamúrias,
Meus azedumes,
Mera falácia
Entre vitórias e derrotas...
Ninguém notou.
Esta sensação de cansaço
Pelo adiantado das horas,
Que também não noto,
Faz-me voltar ao mundo afora,
Curtir aventuras na memória,
Olhares doentios de alguém
A altas horas...
Firulas que o tempo sarcástico
Jogou fora.

Em paz

Em pazes te digo que
A volúpia dos anos pia
Entre choros e alegria
A mesma voz que esvazia
O que fora belo e esfria...
Que guerra é esta,
Ocultada nos marulhos
Da estrada?
Navegamos... Navegais
Ainda em três marias,
Cada uma seu andar,
Cada passo sua poesia...
É nas pazes que te digo
Da volúpia que inda pia...



Perspicuidades

As lembranças
Guardadas na alma,
Cofre chaveado com senha,
Despertam lágrimas e saudade
D’outros engenhos,
Malgrado horas de frio
Azedume e asperezas...
Outras que marcaram
Momentosa singeleza...
São alfinetes pregadores
De recados tornados veros
Pela perspicuidade
De desejos...




Expressões

Quando,
No velório,
Frente ao caixão,
A senhora exclama:
- “Olha, ele parece
Estar dormindo! ”
Penso: - Parece não,
Minha senhora,
Ele está dormindo...










Neste armário
De guardar lembranças
Procuro guardar
Esperanças...





Coisas que parecem inúteis,
Não as jogue fora,
Amanhã voltarão a ser úteis...







Quase tudo que faço
Inutiliza-se com o tempo passado,
Até este verso será jogado...






Quando tudo estiver findo
Esperarei por alguém
Que me desfaça em frisos
Outra vez...




O que importa

Acompanhemos
O raciocínio lógico:
A linha reta
É o melhor percurso?
Só que não sempre,
Às vezes a tortuosidade
É mais lúdica...










Mentes desossadas

Já ferramos os olhos da serpente,
O que nos resta daqui em diante?
Olharmos para nós mesmos,
Interrogativos...
Descobrirei um pouco mais de mim,
Que de mim pouco sei...
Menos ainda do vizinho
Que se socorre nos freios da mãe,
Já feriu tantos na família
Com a obstinação em se locupletar...
Já ferrados os olhos
O que sobra são os ossos
Deixados pelos cães
Que mastigaram o último tutano
E foram descansar...
E nós? Vamos apenas limpar
O sangue derramado...
Meu amigo

Queria o nome
Na coluna do jornal...
Enfim conseguiu,
Mas não na coluna social
Como almejava
Nos bons tempos...
Foi citado hoje
Na coluna policial...









Insurdescência

Dizem que o tempo ensina.
Alguns não aprendem nunca...
Sinto pena desses
Que perambulam pelos tempos
Inadvertidamente lesos...
Obcecadamente surdos...
Esses, que depois de anos
Cometem os mesmos erros
Obtusos.








Custo e benefício

O que te ofertaram
Pelo teu silêncio?
Aquela viagem?
Assim, tão barato?!
Então, é o que vales
D’gora em diante...
Um níquel
De cala boca,
Sem vermelhidão
De tuas faces...







Advertência

O canto existe
Sem ser alegre ou triste...
Apenas apreciando
Movimentos
De cabeças e membros...
O canto existe
Nos que passam,
Que se passem
E por passarem prendem
Atenção em alegorias...
O canto existe
Nas fachadas azulejadas
E nos fúnebres ataúdes,
Cada canto com seu tom
Imaginado lustro,
Embora o apreciador
Se faça surdo...


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