sábado, 30 de maio de 2020


Motivamentos
Escrevo
Para que me aperceba
Das continuidades
Plenas ou desiludidas.
Inda ontem audazes
Num possível convívio
Com as transas da tarde.
Hoje sou verdade.
-Intragável? Como todas
As necessidades deglutidas
A cada mastigável lida.
Se não doesse tanto
Não seria vida.
Que é feito dos momentos?
Um tanto choro, um tanto riso...
As memórias redivivas
De um escrevinhador
Ambicionando
O impossível.



Quase tudo acontece
Quando não...
A chuva na janela aberta,
A mão na porta que fecha,
A chamada na hora incerta...
Quase tudo,
Menos a premeditação
Confirmada pela ação...










Na mesa o vaso,
No vaso a flor,
Na flor a declaração
De amor...




A dor dói, tem mais é que doer,
A única coisa que a dor sabe fazer...






A passagem do tempo

É sempre a verdade
Em detrimento da hora,
Aviltada, evitada?
Diluída em eventos...
O hoje, daqui a pouco
Será ontens,
Inevitavelmente...
Vivido ou não,
Sentido na pele e nos ossos
A erupção do tempo
Na fase, nos gestos,
No entendimento
De todo o resto...







Poema em cores

O azul deste céu invernado
Traduz o frio desagasalhado...
As cores com que se pinta
O dia em curso
Pode seja apenas a cor
Que os olhos fabricam
Com sua íris absoluta...
O preto do teclado
Esquece letras aninhadas
No tom celeste da tarde...
O vermelho das mãos geladas,
O pueril informe das fadas
Na transparência da vidraça...
Quantas cores dividem o dia?
Em partes de sonolências
E ativos lavores rastos
A conteirar os fatos...



Visitando Fiódor Dostoiévski 

As pessoas se atraem?
As pessoas se retraem....
Quem leu “crime e castigo”
Não o pode deixar mais...
Ao inconsciente
O não castigo tanto faz.,
Mas a solidão do medo
Açoita a escuridão
Que se faz ao tempo...
A certa altura a pessoa
Não se sabe salvo...
Apenas se desfaz em
Culpas menores, encaixes,
A vida dos humilhados
À sua volta refaz a cena
A cada esquina
Remoendo as sobras...





“Cem anos de solidão”
É um tempo demais
Para os calos das mãos
Se calarem de vez
Na mente e no coração...
Quem machucou o
“Bebê de Rosemary”
Bota um pé atrás...
Por que as pessoas
Se machucam sem dó
E sem arrependimento?
Porque o entendimento
Já não se dá mais...









A noite anoitece
Sem ter anoitecido,
A dor enrijece
Sem ter enrijecido...








Faz parte do fazer
Na estranha figura
Que deixou de dizer
A que se estrutura...




Sentado à mesa

Espio as coisas sensatas,
A xícara, já trincada,
A luz ainda acendida
Sobre o castiçal de prata...
A própria mesa banzeando
Ao peso do café e seus serviços...
Cadeiras bambeando tempos a fio
Por todos os cafés ali servidos...
O bule empretejado,
O mármore manchado...
A casa tem seu senso de eternidade
Que não vale para mim o trincado,
O mármore insensível ao toque,
Peças que se desfazem lento
Ao redor de meu envelhecimento,
Despercebido deles
Momento a momento...





As novas roupas
Nem sempre são
Roupas novas...

Nenhum comentário:

Postar um comentário