segunda-feira, 28 de setembro de 2020

 

 

 

Quando as tias partem,

 

Desintegram na memória,

A sensação é de que está chegando

Muito perto o cheiro da volta...

É tempo de voltar ao ninho,

Rebuscado pelos ventos,

Ao assobio das cotas permitidas.

Quando as tias partem

As tias partem ilusões idas...

Há uma previsão no ar, a dizer

Que é hora de desfazer as malas,

Terminar a viagem planejada

À espera de um apito de trem

Ou de um pio de filhote

Esperando a passarinha

Na tarde de volta.

 

 

 

 

 

 

 

As vidas humanas,

Assim como os rios,

Desaguam feéricas

Em oceanos vazios...

 

 

 

 

 

 

 

Todos os vértices vertem sangue

Entre a nascente e o poente

Deste sol vermelho acuado ao medo...

 

 

 

 

 

 

 

 

Entre momentos de paz

E momentos de guerra

Há que se respirar

Os ares da espera...

 

 

 

 

 

 

 

 

Todos os argumentos

São válidos,

Até para os inválidos...

 

 

 

 

 

Muro revisitado

 

Somemos todas as esperas,

Cansa-se o sol de prometer

Luminosidades,

Pendão do que já era,

Alvora-se a paz em nova guerra...

Todas as faces se cansaram

De sorrir e chorar os mutilados

Deste tempo ao relento de viver-se,

Sem saudade, ou arrependimento,

Apenas o sentimento vago

De tornar-se nulo,

Além do muro revisitado

Ao tempo...

 

 

 

 

 

 

 

Insanos

 

-Nós comemos cadáveres!

-Ainda não de humanos, ufa!

Não sou vegano, sou humano,

Consumo, sem culpa,

O fígado do abatido!

Seja bovino ou suíno...

É, cadáveres criados aos milhões

Para nosso deleite insano

De consumir o que apartamos...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Assim morre o último ato

 

É incerto o braço

Que se escora no batente e cai...

Entre as mãos pendentes

Um pedido de socorro a mais...

O incerto braço se faz presente,

Mesmo sabendo-se incapaz...

O tempo é solene desesperança

De já não ter tempo

Para mendigar herança...

É incerto o braço que se fez socorro

Mas não se socorre a si

Neste fim de tarde avoengo

De frio a quente, morno

Ao desesperado retorno

Ao mesmo batente em torno...

É incerto o braço

Que se ofereceu inerme

Sob tabuas de pintura fosca

E manchas de escárnio,

Seu último ato...

 

 

 

A morte ajoelha-se

À prescrição da vida,

Seria muito sorrir

Ao choro da despedida?

 

 

 

 

 

 

Em não sendo Guimarães Rosa

Uso meu direito de criar palavras,

Que o dicionário não diz tudo...

 

 

 

 

 

 

 

O ser emergido

 

O ser que emerge

D’um crescente adolescido

Não pode ser confidente

Ao menor juízo...

 

 

 

 

 

 

 

Procuro entender as velhas tias,

A confidenciar com cães e gatos,

Eles sabem guardar cochichos,

Melhor que parentes nisso...

 

 

 

 

 

A passagem do tempo

 

A passagem

Do tempo é variável,

Para o homem, passa doído,

Para o cedro embaça...

Quando o homem é velho

Encara o florir novo do cedro

Em sua graça...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Lusco-fusco

 

Rio que me conformo

Porque sei que vou vencer

A rudeza da manhã,

Que me açoita ao vento

Desenfreado do nascer do sol...

Cristalizado nessa névoa

Trago para depois o prêmio

De ter vencido a borda

Das manhãs...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Percepções                      sergiodonadio

 

Agora percebo que a permanência

Do homem na terra é limitada

Aos dias numerados friamente

E ao ser fracamente mortal...

Não sabemos o que está à frente,

Amanhã só o amanhã percebe,

Mas o amanhã pode nunca chegar!

Hora de pensar que temos filhos

E os filhos têm filhos, e, apesar

De sua rebeldia adolescente,

Os amamos... Que dizer ao pai?

Ao irmão apesar dos pesares?

Eles são caros a cada coração...

Mas, se o amanhã não chega,

Como lembrar olhares de procura

Às emoções que refletem a chama

Do que denominamos amor,

Que arde dentro do peito?

Lembrar que, apesar de a vida

Ser curta e imprevisível,

É bela e esperançosa, e, o que

Se poderia fazer dela eu fiz!

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