domingo, 4 de março de 2018


Santidades


Despenduro na parede
As dores do tempo,
Esse retrato de mim mesmo,
Amarelecidos,
Essas manchas das águas
Passadas…
Esse calor da janela aberta,
E seu hálito de roçado…
Dependuro essas paisagens
Vívidas em mim,
Sem pecado.












Enquanto caminhamos


Enquanto caminhamos
Se apequenam as distâncias…
O que seria breve
Dura uma vida, não a tua ou a minha,
A da flor que te ofertaram
E murcha antes do dia cedo.
Enquanto caminhamos
O sol se põe de novo,
A árvore assombreia
Na vida feito breve nessa teia,
Frente à eternidade das distâncias.
Enquanto caminhamos
Pensemos nas possibilidades,
De ir além de assoprar as nuvens,
Demudar as pedras
Desses caminhos ásperos…
Enquanto caminhamos
Paralisemos o vento
Que assusta as folhas soltas
E as paredes deslombadas
Desobedecendo a esperança magra
De sermos donos de tudo,
Enquanto caminhamos…
Compartes


A palavra, sem querer,
Encobre uma lágrima,
O gato aleijou-se na briga de rua
E volta
Trôpego, pedir socorro…
Quase nada,
Um lenitivo que o faça sentir-se vivo,
Uma pomada?
Um carinho?
Quase nada que não se possa atender
Sozinho….












Perpasses


A paz que te queria
Foi-se,
Abanando um lenço úmido
De consolos…
Agora, desmemoriado,
Tremes as dores
Que não se foram,
Com linimentos e cicatrizes,
Esperas,
Cuidando seu velho cachorro,
Suas dores e secreções,
Lamentos de que eras
E que se tornou extensa
Fiada de louvores:
Sacudir o tempo desengano
E ter de novo o olhar
A perpassar os anos.






As palavras difíceis


As palavras difíceis,
Aquelas que te conscientizam,
Saem da boca inesperadamente
Para outro juízo.
Aqui podemos dizer
Cada sentimento
Findo o tempo escurecido
Pela vergonha de dize-lo.
Aqui podemos soletrar
Apelos à ordem das coisas,
Primeiro a obrigação de ser,
Depois a desobrigação de não ser.
As palavras fáceis,
Aquelas que elogiam os erros
Saem da boca sem arrependimentos
Por fazer sorrir o outro,
Mesmo em desvelo.

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