sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015




Os dias passados


Os dias passados
São uma relíquia
Que todos guardamos
Em nosso íntimo.
Queira ou não
Haverá sempre um cantinho
De memória
Para esta celebração
Das coisas que se foram
E ficam esfiapando-se
Nas horas atuais,
Disputando espaço
Com outros aconteceres,
Mais reais.
   








Expirados


A vantagem de não ser
Talvez seja
A de ter sido...
Experiências fazem parte
Das cicatrizes,
Saudade das coisas boas
Na imemória das ruins...
A vantagem de não ser
É ter jogado fora
As mágoas de perecer
Antes.












Os gatos


Frente à hora da morte
Ele pensa no gato
que morreu
Antes,
Pensa na tia, na avó,
Nos pequenos animais
Esmagados no asfalto...
Talvez vá se encontrar
com todos
Na hora da morte
Revisitar sentimentos
Deixados morrer junto
Quando as tias, a avó,
o gato,
Olharam lacrimosos
Para sua indiferença
Na hora de suas mortes.








Fadiga


No cansaço das horas
Perdidas nos bares,
Cassinos, guaridas,
Faz da solidão do soldado
Um ser estranho, armado,
E com um olhar de carinho
Pelos sobrevivos.
  













Insuetos


Todos passeiam pela praça,
Poucos veem as flores pisadas,
Raros sofrem por isto.
Uns tantos cuidam delas,
Outros cuidam-se no não visto,
Mas a bosta dos cachorrinhos
Não tem culpa
De ser ali o último lugar
Onde podem defecar
Sem serem molestados
Pela ordem das coisas
Patronais.











Temporal


O tempo por vir
Não te pertence...
O tempo passado
É esquecimento.
O tempo vivido a cada tempo
É vívido na memória
Dos contratempos.
Piora a cada análise
A espera por essa melhora
Que o tempo temporiza
E não avisa.











Partidas e chegadas


-Chegarei às duas horas.
Dizia laconicamente o e mail.
São duas horas... Três... Seis...
Nada de chegada ou aviso
Além do improviso.
As horas passam rápido
Quando não se as espera passar
Mas
Caminham lentamente quando
Estamos a esperar.
Pela chegada?
Pela partida de algum outro lugar,
Vindo a ter conosco a dúvida:
 - Quando – Por quê?
Nenhum telefonema,
Nem sinal de fumaça, o antigo
Estilo de viver considerando
As partes envolvidas...
-Para que, se tudo se conformará
Em seguida?



Arames farpados

O dia passou devagar
Até às dezenove horas.
Aí ele para,
O relógio não comanda mais
Nada.
O marasmo é que dita ordens
De conviver com o suor,
A lentidão das gotas descendo
Atrás de orelhas penosas
De ouvir sussurros...
O tilintar de copos de vidro
Em anéis de lata
Nas mãos calejadas, trilhadas
No carvão das tarefas...
Que parte de cada um mais sofre?
A consciência do matemático
Ou as pernas do carteiro?
Talvez a mão que estendeu o copo,
Com suas unhas carregadas
E suas cicatrizes de arames
Trazidos pelos campos
Cercados de tarefas...
Agora o dia acaba.

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