domingo, 19 de abril de 2015



Prato feito


Olho para o prato
E me satisfaço... Ou melhor,
Me empanturro só de olhar
Para aquele verde nojo.
O cão vadio me espia guloso,
Jogo um tanto para ele,
Que se indigna e sai.
Penso:- Nem tua fome é tanta?
Saio a procurar outros males...
Encontro à porta uma mulher
Vestida rota, esquisita,
Que também expia a fome,
Relativando a minha...
Nem ela aceita o prato mal feito
De arroz de anteontem
Fedendo azedumes do tempo.
Esta realidade assusta quando
Comparo nossas faltas famélicas
Às dos passantes,
De terno surrado, gravata,
Sob o sol de verão paulista...





Observando essa vida deles
Sinto saudade da minha vida
Pregressa, com arroz e feijão
Cozidos na hora, uma parte
Ínfima de frango
e chuchu à vontade...
O pão... Caseiro...
Que bom que era...
Fosse agora.
Olho para o prato
E vou embora.












As formas de dizer adeus


Há muitas formas
De se dizer adeus...
A mais doída é com os olhos.
Olhares frios não deixam
De mais nada esperar.
Os lenços brancos
Nas mãos abanadas,
Esquecidas no ar...
Os chapéus nos braços
Gesticulados, ou apenas
O olhar, distante,
Num “tanto faz” esnobe
Dos até logos...
Mas o olhar lacrimado
É o mais sentido,
Que se faz sentir,
E que faz sentido esperar
Esquecer o esquecido.





A volta para casa


Voltando para casa,
As flores outra vez dando
Boas vindas...
É um bom começo.
Quem sabe mais alguém
Abra a porta,
Alguém que eu conheça,
Ou que me conheça...
E me receba de braços abertos...
Mas até a casa é outra
Mudou-se de fachadas e janelas,
Portas travadas, travas elétricas...
Os brinquedos na entrada,
O balanço deixado enferrujar...
Uma paz que não compartilha
Com a despedida...
Suamos horas de brincar vivências...
Expedicionar atrás dos muros,
Das cercas balaustradas,
Tempo de procurar encontros...






De vivência pura
Deixada quebrar-se na procura
Doutros suores reais.
Voltando para casa percebo
Que, na verdade, não saí dela,
Não me despedi das coisas velhas.
Agora velho, quero brincar
De esconder-me deles
Atrás dos afazeres, dos muros,
Cercas de balaustres contadas
E conferidas sempre
A caminho da escola,
Também memória.










Expirações


Cada momento respirado
Percebo que menos existo
Em mim...
Como o tronco apodrece
Suas entranhas,
Sinto ceder-me forças.
Devagar nos encaminhamos,
Eu e meu corpo,
Para um desenlace final.
Talvez quando o cansaço,
Que vem avisando,
Der sua ordem de partida,
Eu me vá, sem despedida,
Com a casa limpa,
Cada coisa em seu lugar,
Como Bandeira,
Descompromissado
De voltar.



Nenhum comentário:

Postar um comentário